Hebron é tudo aquilo que eu não esperava: real. Ingénuamente, achava que as consequências do conflito estavam amenizadas e que a situação estava calma nos centros urbanos. Não está.
Embora a maioria dos palestinianos esteja traumatizada o suficiente com as atrocidades cometidas às suas famílias – para preferir uma resistência pacífica ao confronto armado -, quase todos os dias os míudos, meio enlouquecidos pela ocupação de 20% da sua cidade, começam a atirar pedras aos postos de controlo militares.
A resposta toma a forma de gás, cuja presença já não é estranha aos civis. A rua Shuada, a antiga principal artéria da cidade, está interdita ao povo que a viu nascer, e completamente deserta. Como se não bastasse a violência gratuita dos soldados, os palestinianos ainda têm de se submeter a todo o tipo de agressão verbal.
Tanto os chamados settlers (civis israelitas que ocupam as casas ou habitam os colonatos ilegais), como grande parte das unidades destacadas em Hebron, são extremamente racistas. Desejam a extinção dos árabes do território, chamam-lhes cães e não os consideram como iguais. Fazem o que podem para prejudicar o quotidiano de quem não tem outro lugar a que chamar casa, e que, incrivelmente, ainda não optou por ceder e partir, continuando a acreditar num futuro próspero e pacífico.
Já testemunhei tudo isto. Ao chegar, rapidamente percebi que o meu trabalho não seria nos campos de refugiados, por serem antigos e se terem transformado em habitações permanentes, mas sim nesta cidade metade fantasma. Os planos alteraram-se, e agora quero ir mais longe. Ver mais, testemunhar mais e viajar mais.
Tenho falado com muitas famílias e ouvido as suas histórias, tenho seguido os jornalistas na confusão e, de certa forma, tudo isto já me parece menos bárbaro. O meu coração encolheu ao ver miséria numa terra cuja potencialidade toca no céu.
E só de pensar que tudo isto aconteceu, acontece, com todo o mundo a ver. O jogo de interesses capitalista deixou-nos extinguir uma nação e transformá-la em cerca de 6 milhões de refugiados e 5 milhões de infelizes. O que seria do nosso Portugalinho se de repente lhe despejassem uns milhares de chineses e nos pusessem todos a viver em Trás-os-Montes, apelando à justiça divina?
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