Mia Couto
Os números mortos
Era a moça mais linda, no tempo do liceu. Exibia essa beleza que só existe para ser eterna
A cicatriz
O meu pai teve um destino engrandecido: foi dono de uma funerária. A empresa chamava-se “Eterna Esperança”. O pai recebia os clientes como se estivesse numa agência de viagens
A Tabuleta
– As pessoas para mim são como nuvens – divagou o mais novo dos três. – Passam por nós e cada uma parece ser única, mas depois são todas iguais
O tamboreiro
A guerra que agora vivemos espalhou tanta pólvora sobre os caminhos que é bem possível que os vivos e os mortos se tenham perdido uns dos outros
Lição de caligrafia
A escrita pretende ser uma arrumação do caos. E como há muita variedade de caos, também há muitos modos de os ordenar
O vendilhão do tempo
Dizem os antigos: deixemos o tempo sossegado para que ele possa dormir dentro de cada pessoa
O descrucificado
Às vezes penso que, desde há milénios, estamos todos, no mundo inteiro, abrindo a mesma estrada
A roupa e o nome
As razões dela eram simples de explicar: em casa ou no hospital, os nossos mortos são nossos, lavámo-los com as nossas lágrimas
Mia Couto: Contra o esquecimento
São contos em forma de crónica, crónicas em forma de conto, uma vez por mês, na revista VISÃO, e agora recolhidas no livro "O Caçador de Elefantes Invisíveis", uma edição da Caminho já nas livrarias. O JL entrevista o escritor que defende uma superação pela positiva do passado, sem esquecimentos
O colchão
Com o andar do tempo, as mãos da minha mãe foram perdendo agilidade. Deitada sobre o seu colo, eu sentia um desgosto antigo travando-lhe os dedos. Não é no rosto, é nas mãos que a idade se revela
"O Caçador de Elefantes Invisíveis", de Mia Couto: Tradutor de mundos
As crónicas do escritor moçambicano na VISÃO, agora reunidas em livro, revistas e aumentadas, oferecem-nos um retrato expressivo de Moçambique, num olhar diferenciado sobre a atualidade
Morrer de raça (2)
Sabíamos que o mundo era grande, mas estávamos longe de pensar que houvesse uma tal variedade de raças
Histórias para empurrar as margens do rio
Crítica de Agripina Carriço Vieira ao novo livro de Mia Couto, O Caçador de Elefantes Invisíveis
Mia Couto: o regresso aos contos de um 'imperfecionista'
O novo livro do escritor moçambicano Mia Couto, "O Caçador de Elefantes Invisíveis", reúne contos escritos a partir das crónicas publicadas mensalmente na VISÃO. O lançamento aconteceu nesta quinta-feira, 4, na Biblioteca das Galveias, em Lisboa
Morrer de raça (1)
Aconteceu o que receávamos: saiu daqui "muno mutema" e voltou "murungu". Noutras palavras, quando saiu era dos nossos, um negro congénito. Quando regressou, era branco
Mia Couto lança hoje em Maputo o novo livro "O caçador de elefantes invisíveis"
O escritor moçambicano Mia Couto lança hoje "O caçador de elefantes invisíveis", uma obra cuja base é uma seleção de crónicas publicadas na revista portuguesa Visão, anunciou a Fundação Leite Couto, em comunicado
Uma submissa desobediência
Tudo isso recordo, sentada na minha cozinha, em frente à porta que nunca mais se abre. O locutor da rádio insiste: hoje pode ser o primeiro dia de uma vida nova
O eterno retorno
Conversa entre pedras
Agitado, Gama alertou: andava pelo mundo um movimento reclamando o derrube das estátuas. Se não as derrubavam, desfiguravam-nas com tintas sujas e frases feias. O poeta encolheu os ombros e relembrou os seus próprios versos: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”
A alma têxtil
Cancelara os serviços de telefone quando recebeu a notícia da morte do seu companheiro de armas, o general Acácio Teixeira Lobo. Teve medo de que aquela fosse a primeira de outras notícias fúnebres. E havia uma outra mágoa: anúncios de baixas fazem-se em visita solene, olhos nos olhos. Nunca por telefone
A libélula
No sonho, o filho corria por entre os arbustos à procura do que faltava no corpo da mãe. Esgueirava-se por entre a folhagem, e o ruído dos passos convertia-se num rastolhar de bicho. Mariana tinha olhos de caçadora, mas foi perdendo o rasto de Madzina. De súbito, escutou tiros. Conhecia bem esse estampido que faz suspender o mundo