Até há muito pouco tempo ninguém arranjava par online – nem isso nos passaria pela cabeça, pelo menos antes de as “apps para conhecer as pessoas da nossa vida” e afins terem invadido o mercado. Íamos já bem lançados nos anos 1990 quando ouvimos falar, pela primeira vez, de sites de namoro. O primeiro, lembra-se?, chamava-se Match.com, e era a última loucura da internet. Depois, já nos anos 2000, surgiria uma nova onda de sites de namoro. Mas só com a chegada do Tinder, em 2012, o cenário mudaria como nunca o imagináramos: hoje, mais de um terço dos casamentos começam online.
Se até agora já era óbvio que tudo isto tinha um enorme impacto na forma como as pessoas namoram, o que agora se tornou claro foi que esse efeito é mais profundo do que isso. E para quem anda a estudar a natureza dos vínculos que se estabelecem entre as pessoas é claro que as redes sociais acabam por ter características muito peculiares.
No mundo antes das redes sociais – e dos sites de namoro, em particular – as pessoas estavam muito ligadas aos vizinhos e a quem vivia próximo. Agora, até podem continuar ligadas a um pequeno grupo de pessoas que circulam nas proximidades, mas estão também vagamente conectadas a gente que está a muitos quilómetros de distância. E são estas conexões, que parecem mais frouxas, a fazer toda a diferença.
“São laços que servem de ponte entre o nosso grupo de amigos íntimos e outros mais distantes, permitindo que façamos parte de uma comunidade global”, adianta Josue Ortega, da Universidade de Essex, no Reino Unido, e Philipp Hergovich, da Universidade de Viena, na Áustria, citado num recente artigo do MIT Technology Review.
Tradicionalmente, as ligações menos fortes tinham um papel fundamental quando se tratava de encontrar a cara-metade – no sentido em que a maioria das pessoas não namorava os melhores amigos, mas era muito provável que o fizessem com alguém ligado ao grupo; um amigo de um amigo, por exemplo. Se pensarmos nisso em termos de teoria das redes, o que acontecia era que os parceiros de namoro acabavam por ser incorporados nas redes uns dos outros. Fosse no trabalho, na escola, através de amigos comuns ou de familiares.
O mundo de encontros pela internet mudou tudo isto. Hoje é a segunda maneira mais comum de casais heterossexuais se encontrarem – no caso de pessoas do mesmo sexo, aí então, é de longe o mais popular.
Qual é o problema? “As pessoas que se conhecem pela internet tendem a ser completamente desconhecidas”, sublinham Ortega e Hergovich – e quando se encontram dessa forma tendem a estabelecer vínculos que antes eram absolutamente inexistentes. Isso tem um valor extraordinário para aquela equipa de cientistas, que quer estudar como é isso também muda, por exemplo, a diversidade étnica da sociedade. “
Os investigadores começaram então a simular o que acontece quando ligações extra são introduzidas numa determinada rede, com homens e mulheres, de diferentes etnias, distribuídos aleatoriamente. No modelo estudado, toda a gente quer casar com alguém do sexo oposto, mas tem de escolher alguém com quem tenha algo em comum. Isto leva, quase obrigatoriamente, a uma sociedade com um nível relativamente baixo de casamentos entre pessoas de diferentes origens. Mas, quando introduziram ligações aleatórias a essas mesmas pessoas, o nível desses casamentos mudou drasticamente.
Registou-se ainda outro efeito surpreendente ao avaliarem a estabilidade dos casamentos – pela distância média entre os parceiros antes e depois da introdução do namoro online. “O osso modelo prevê ainda que os casamentos que avançaram a partir de namoros pela net sejam mais fortes”, salientam ainda Ortega e Hergovich.
Depois, resolveram ir comparar os resultados dos seus modelos às taxas de casamento entre diferentes etnias nos EUA – algo que até há pouco tinha taxas muito reduzidas, até porque isso chegou a ser proibido naquele país até 1967. Mas, desde que o namoro online se tornou popular, a taxa aumentou exponencialmente. “Notámos esse crescimento pouco depois de aparecer o Match.com, em 1995”, e esse aumento, adiantam, tornou-se ainda mais acentuado depois de 2000. A partir de 2014, dois anos depois dessa revolução chamada Tinder, a proporção voltou a aumentar – falamos de uma app de encontros com mais de 50 milhões de utilizadores e mais de 12 milhões de pares criados diariamente.
O outro efeito surpreendente foram as taxas baixas de separação de casais que se conheceram online, comparados com aquele que se conhecem pelas formas ainda consideradas tradicionais – e isso tem o potencial de beneficiar significativamente a sociedade, que é o que o modelo daqueles dois cientistas prevê.