O que fazer quando todos os esforços desaguam num cansaço sem fim e não sobra tempo para nada, nem para nós ou aqueles que mais amamos? No início da vida adulta até podia ser divertido andar sempre a abrir e estar sempre em todas. Porém, chegou o dia na vida de Brooke Mcalary em que ela se viu obrigada a abrandar. No começo era embaraçoso andar em modo lento, coisa que não é suficientemente valorizada socialmente. Hoje, o seu nome está associado ao movimento The Slow Home, que é igualmente o nome do podcast mais popular na área da saúde do iTunes, produzido e apresentado por Brooke e o marido.
A mensagem não é particularmente nova, a forma como Brooke a partilha com os seus seguidores sim. No livro Simplificar (Clube do Autor), a famosa australiana fornece conselhos práticos, partindo do seu caso: em dois anos, chegou a retirar 25 mil peças da casa onde vive e o seu mundo descomplicou-se. Isto só foi possível porque a ideia foi cozinhada dentro de si, após reaprender a dar atenção ao seu corpo, aos seus ritmo, aos rituais – por exemplo, quando desligar, fazer apenas uma coisa de cada vez, etc – e aos ajustes necessários, a cada momento, para que os dias sejam desfrutados com prazer. Sim, prazer, um sentimento que Brooke chegou a pensar nunca mais ser possível resgatar, nos dias da depressão pós-parto. É disso que fala nesta entrevista: da arte de simplificar e de desacelerar, a fim de usar o tempo que temos, esse bem precioso e escasso, para o que consideramos essencial.
O que fazia antes de adoptar um estilo de vida simples?
Há sete anos, a minha vida era o oposto daquilo que é hoje: simples e consciente. Sentia-me constantemente exausta, sobrecarregada e stressada. A nossa casa estava atulhada de roupa, móveis, brinquedos e coisas que achávamos que eram precisas. Durante anos trabalhei até a exaustão, na esperança de que um dia encontraria a felicidade, medida pelo que era capaz de ter e de possuir. Não funcionou.
O que a levou a mudar?
Quando nasceu o nosso segundo filho, em 2010, fui diagnosticada com depressão pós-parto grave. Estava ansiosa, triste e ressentida, incapaz de desfrutar da família e das coisas boas da minha vida. Queria mudar mas mas não sabia como. Uma noite, entrei na internet e digitei a pergunta: “Como simplifico minha vida?” Descobri muita coisa sobre sobre minimalismo. Não percebi logo como é que ter menos coisas tornava as pessoas mais felizes, com mais tempo, espaço, clareza e gratidão, menos dívidas, stresse e confusão. À medida que fui lendo sobre o tema, também quis fazer essas mudanças. Pus mãos à obra e comecei a libertar carga.
Como aplica o conceito do minimalismo às suas rotinas e no seu quotidiano?
O minimalismo pode ser visto em duas vertentes, igualmente interessantes. Uma é estética e visível no design, na arquitetura, nos acabamentos elegantes e nas cores monocromáticas. Pode aplicar-se à depuração de espaços, vestuário, peças de arte e nos materiais de construção. Enquanto estilo de vida, o minimalismo é mais adaptável e envolve a vontade de questionarmos os nossos hábitos e as histórias que contamos sobre quem somos. E, em seguida, eliminar excessos de todo o tipo – objectos, compromissos extras, culpa, dívidas, hábitos negativos ou uso excessivo de tecnologia, por exemplo – de forma a criar espaço para gastar tempo e energia nas coisas que são importantes. As minhas podem não ser as mesmas que as do meu vizinho, e tudo bem. Entendo que também é uma atitude, em contracorrente com a economia de consumo. Trata-se de assumir que já não se participa do frenesim de comprar e possuir constantemente. E de agir contra o status quo, o que não deixa de ter o seu quê de divertido e desafiador!
Qual foi a resposta dos leitores e seguidores? Houve realmente uma mudança de paradigma nos percursos deles?
Foi maravilhoso. Eu acho que muitos de nós andam tão assoberbados pelo ritmo e o caos nas suas vidas que só precisam de permissão para largar, deixar ir. Apercebem-se de que podem simplificar e abraçar uma vida com menos e melhor. Isto acontece porque os media, a publicidade, as revistas, os programas de TV e os media sociais passam muitas vezes a mensagem de que para ser bem sucedido é preciso comprar, fazer e ser mais. Ouvir uma mensagem contrária acaba por ser um alívio. Perguntam-me frequentemente por onde devem começar a simplificar. Costumo sugerir que o façam a partir de coisas pequenas. Por exemplo, não tentem organizar o guarda-roupa inteiro num dia, comecem pela bolsa ou a mala. Comprometam-se a remover cinco itens de uma prateleira da sala de estar. A mudança faz-se por etapas pequenas mas consistentes. Não é através de grandes purgas, uma vez por ano (as chamadas limpezas de primavera ou de verão).
Qual é o desafio mais difícil para quem começa a fazer mudanças?
É realmente fácil colocar a culpa da desordem ou da incapacidade de fazer mudanças nos ombros de terceiros. Porém, é fundamental encarar a nossa própria tendência para o excesso e a acumulação. Quando me empenhei no processo, acreditava que a maior parte da desarrumação se devia aos brinquedos e roupas dos filhos, mas percebi que a grande maioria era minha. Tive de questionar-me porque tinha a casa a abarrotar de coisas, tive de aprender a desapegar-me. Aos poucos, os outros começaram a ver os benefícios (o meu marido percebeu que havia menos limpeza para fazer ao fim de semana, por exemplo) e começaram, também eles, a fazê-las. Não podemos forçar os outros a fazer alterações ao nosso lado. Podemos dar o nosso exemplo, desfrutar dos benefícios e ser pacientes paciente. Se alguém ficar com curiosidade e quiser saber o que estamos a fazer, aí está a oportunidade para falar sobre isso.
Quais são os principais benefícios a longo prazo?
O problema da vida moderna é que o ritmo acelerado raramente nos permite parar e pensar. Ao nos sermos intencionais com o nosso tempo, espaço, energia, trabalho e esforço, lentamente criamos tempo. Criamos oportunidades para desacelerar e simplesmente pensar. Só quando nos permitimos esse tempo para reflectir e ficar curiosos é que podemos fazer perguntas maiores acerca da vida. Que significado tem isto ou aquilo para mim? O que quero deixar para trás? E o que pretendo manter? A partir daí começamos realmente a fazer a diferença, com impacto em nós e nos nossos relacionamentos, na comunidade e no modo como tratamos o planeta.
Todos podem fazer isso ou é necessário ter algum pré-requisito?
O único pré-requisito é disponibilizar-se para isso. Ter a curiosidade e a motivação para investir no trabalho de deixar ir. Todos podemos ter uma vida mais simples e isso nada tem a ver com quanto dinheiro ganhamos ou onde moramos: tem apenas a ver com a forma como escolhemos gastar nosso tempo.