A VISÃO publicou, na terça-feira, 17, um artigo intitulado “PAN propõe medidas ambientais que já estão em vigor” – uma avaliação do capítulo “Crise Climática, Justiça Ecológica, Transição Económica” do programa eleitoral do partido. O lead da notícia dizia que eram feitas várias propostas que já existem, além de haver “outras incongruências” naquela que é dada como a área em que o PAN tem mais conhecimentos.
O PAN, entretanto, respondeu no seu próprio site, e divulgou nas redes sociais, um texto em que “refuta” o artigo. Publicamos aqui o texto do PAN na íntegra, acrescentando, ponto a ponto, um fact-check às supostas refutações. (Nota: as respostas do PAN estão em itálico e o fact-check da VISÃO está a negrito; os subtítulos, a vermelho, são nossos.)
Ontem, ao fim do dia, a Visão publicou uma peça com o título “PAN propõe medidas ambientais que já estão em vigor”. Desmontamos passo a passo o que diz a revista online:
Pescas
1. Sobre a proposta PAN: “Implementar sistemas de certificação do pescado, com a identificação do método de pesca na rotulagem, nomeadamente arrasto, cerco ou aquicultura”
A Visão diz: Já existe há cinco anos, desde que, a 1 de janeiro de 2014, entrou em vigor o Regulamento Europeu 1379/2013, relativo à rotulagem do pescado (as regras tornaram-se aplicáveis a partir de 13 de dezembro de 2014). Os rótulos incluem as artes de pesca utilizadas.
O PAN refuta e explica: Na peça a questão é resumida à rotulagem, omitindo que a certificação do pescado é facultativa. A medida do PAN vai no sentido de garantir que a certificação do pescado acontece sempre.
Não se percebe bem o que o PAN quer dizer com isto. Desde 2008 que a União Europeia exige certificação que garanta que o peixe não foi capturado ilegalmente. De resto, o sistema implementado atualmente, desde 2014, é muito exigente: obriga (ou seja, não é uma regra facultativa, como o PAN diz) à identificação do método de pesca na rotulagem (“rede envolvente‑arrastante, redes de arrasto, redes de emalhar e redes semelhantes, redes de cerco e redes de leva, anzóis e aparelhos de anzol, dragas e nassas e armadilhas”), da “zona de captura/país e massa de água/país de produção” e o método de produção (“capturado, capturado em água doce, cultivado”).
É possível que o PAN se refira a certificações ecológicas que garantam que o peixe foi capturado ou cultivado de forma sustentável. Mas esse tipo de certificação também não é novo (por exemplo, os selos do Marine Stewardship Council, para peixe capturado, e do Aquaculture Stewardship Council, para aquacultura). Não são efetivamente obrigatórios – mas a proposta do PAN também não refere qualquer obrigatoriedade. Recorde-se: “Implementar sistemas de certificação do pescado, com a identificação do método de pesca na rotulagem, nomeadamente arrasto, cerco ou aquicultura.” Esses sistemas estão já implementados há anos.
Ou seja, nestes termos, o PAN propõe o que já existe.
Aeroportos
2. Sobre a proposta PAN: “Restringir o tráfego aéreo no período nocturno, excepto em situações de emergência”
A Visão diz: Já é restrito por lei há 15 anos em Lisboa, há 12 anos no Porto, Funchal e Porto Santo, e há nove anos em Ponta Delgada: nestes aeroportos, “o tráfego noturno é restringido entre as 0 e as 6 horas”, lê-se no site da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC). “O Regulamento Geral do Ruído proíbe a aterragem e a descolagem de aeronaves civis entre as 0 e as 6 horas, salvo por motivo de força maior.”
O PAN refuta e explica: O Regulamento Geral do Ruído proíbe, nos aeroportos e aeródromos não abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 293/2003, de 19 de novembro, a aterragem e a descolagem de aeronaves civis entre as 0 e as 6 horas (LT), salvo por motivo de força maior. No entanto, por portaria conjunta dos membros do Governo responsáveis pelas áreas dos transportes e do ambiente, pode ser permitida a aterragem e a descolagem de aeronaves civis entre as 0 e as 6 horas (LT) nos aeroportos e aeródromos, em determinadas condições específicas. O que é que acontece? Estão previstas excepções em Portaria para todos os aeroportos nacionais. Em Lisboa, por exemplo, pode haver 26 movimentos por noite (leia-se entre as 0h e 6h). Isto significa que pode haver 4 voos por hora ou seja 1 voo de 15 em 15 minutos, entre as 0 e as 6h. No aeroporto da Madeira, por exemplo, pode haver até 31 voos naquele horário.
Recorde-se o que propõe o PAN: “Restringir o tráfego aéreo no período nocturno, excepto em situações de emergência.” A proposta não vai no sentido de proibir totalmente as descolagens e aterragens, acabando com as exceções. “Restringir”, segundo os dicionários, significa “reduzir, limitar, moderar”. Aliás, o partido usa exatamente o mesmo verbo que consta da lei: na portaria nº 303-A/2004, lê-se “O tráfego noturno é restringido entre as 0 e as 6 horas”. O PAN poderia ter proposto “proibir o tráfego aéreo no período noturno”, mas não foi isso que fez.
Mais uma vez, o PAN propõe o que já existe.
Bicicletas
3. Sobre a proposta PAN: “Actualizar o Regulamento do Seguro Escolar, garantindo a inclusão das bicicletas como meio de transporte na deslocação casa-escola”
A Visão diz: O governo antecipou-se ao PAN: este ano letivo, as deslocações em bicicleta já estão abrangidas pelo seguro escolar.
O PAN refuta e explica: O que a peça não diz é que a medida do Governo saiu já depois do PAN ter apresentado o seu programa eleitoral. A notícia / medida do Governo é de 13 de Setembro. O PAN apresentou o seu programa eleitoral a 30 de Agosto.
O que o PAN não diz é que o anúncio da medida do Governo foi feito pelo ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, a 9 de agosto – três semanas antes de o PAN apresentar o seu programa.
O PAN propôs o que já estava anunciado.
Louça descartável
4. Sobre a proposta PAN: “Limitar a disponibilização de louça descartável, de qualquer tipo de material, nos estabelecimentos de restauração e bebidas”
A Visão diz: A lei que “determina a não utilização e não disponibilização de louça de plástico de utilização única nas atividades do setor de restauração e/ou bebidas e no comércio a retalho” foi publicada em Diário da República a 2 de setembro deste ano. O projeto-lei, aliás, foi originalmente apresentado pelo próprio líder do PAN, André Silva, em janeiro de 2018, e aprovado em julho deste ano em reunião de Comissão.
O PAN refuta e explica: O próprio nome da lei esclarece (Lei 76/2019) que somente é abrangida a louça de plástico de utilização única, não havendo qualquer limitação para outros materiais. O PAN quer alargar a todos os tipos de materiais descartáveis.
Era útil, neste caso, saber a que outros materiais se refere. Papel? Nesse caso, por que motivo não especificou os tipos de material? E se quer banir a “louça” de papel, por que razão o partido defendeu, na Assembleia Municipal de Lisboa, o incentivo ao uso de palhinhas de papel (além de metal e bambu), em alternativa às de plástico?
Poluição
5. Sobre a proposta PAN: “Determinar quotas para navios de turismo nos portos portugueses, assegurando meios de controlo de poluição. (…) As emissões [poluentes] dos navios de cruzeiro na costa portuguesa foram 86 vezes superiores às emissões da frota automóvel que circula em Portugal”
A Visão diz: A justificação da proposta dá a entender que se trata de gases com efeito de estufa, ou quando muito de emissões poluentes em geral. Mas não: estes números (emissões 86 vezes superiores às emissões de todos os automóveis em Portugal) dizem respeito a emissões de uma só substância em particular, o óxido de enxofre, que não é sequer um gás com efeito de estufa direto. Esse facto não é mencionado em qualquer lado. Os dados originais são de um comunicado da associação ambientalista Zero, divulgado em junho.
O PAN refuta e explica: Como poderão constatar, esta questão não tem sequer âmbito de acordo com o título desta peça da Visão. Não se vislumbra qualquer referência à medida em termos que possam significar que há já uma medida semelhante implementada. Ao invés o jornalista opta por se centrar no tipo de emissões.
O título da peça da VISÃO diz respeito às propostas que já estão em vigor, que são a maioria dos pontos que o artigo foca. O lead da notícia, no entanto, acrescenta “Mas há outras incongruências”, demonstrando que o texto incide sobre mais do que apenas as propostas redundantes do PAN.
Registe-se que o PAN, ao preferir focar-se no título da peça, não responde à substância deste ponto: ter dado a entender, de forma enganosa, que os navios de cruzeiro na costa portuguesa emitem 86 mais poluentes em geral ou gases com efeito de estufa do que todos os automóveis nas estradas portuguesas.
Vida selvagem
6. Sobre a proposta PAN: “Criar túneis ou passagens aéreas na rede rodoviária, que permitam a passagem em segurança de espécies silvestres”
A Visão diz: Construir passagens subterrâneas para diminuir o atropelamento de animais em zonas consideradas sensíveis são, há muitos anos, medidas de minimização correntes na construção de estradas e autoestradas.
O PAN refuta e explica: O PAN propõe “Criar túneis ou passagens aéreas na rede rodoviária, que permitam a passagem em segurança de espécies silvestres”. Fá-lo não porque não existam soluções, mas porque as que existem são em número insuficiente, o que se extrai dos números com que nos deparamos anualmente. A Universidade de Évora apresentou um estudo onde registou, em média, a morte de 120 animais por Km/ano. Em 2016 a GNR contabilizou para cima de 1000 acidentes rodoviários, derivados de embate em animais, como aves, javalis, raposas, veados. No nosso país, os distritos mais mortíferos são Santarém, Viseu, Lisboa, Porto, Leiria e Beja.
A proposta do PAN é “Criar túneis ou passagens aéreas na rede rodoviária, que permitam a passagem em segurança de espécies silvestres”. Não é “aumentar o número de passagens”. Em lado nenhum se diz que este tipo de solução já se pratica há muitos anos mas é ainda insuficiente, como o partido vem agora acrescentar.
Mais uma vez, com esta medida, da forma como está apresentada, o PAN propõe o que já existe.
Garantias
7. Sobre a proposta PAN: “Aumentar o período de garantia dos equipamentos eléctricos e electrónico”
A Visão diz: A legislação relativa às garantias de produtos é da responsabilidade da União Europeia, não dos Parlamentos (que se limitam a transpor as diretivas para a ordem jurídica nacional).
O PAN refuta e explica: A directiva 1999/44/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Maio de 1999, relativa a certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, diz no seu art. 8.º n.º 2. que “os Estados-Membros podem adoptar ou manter, no domínio regido pela presente directiva, disposições mais estritas, compatíveis com o Tratado, com o objectivo de garantir um nível mais elevado de protecção do consumidor”. Parece-nos suficientemente claro: os Estados têm competência para legislar e podem ir mais longe que o disposto na Directiva, como pretendemos, não devem é ficar aquém do que lá está disposto.
Dos 28 países da União Europeia, 5 foram realmente mais longe do que a lei europeia. Mas em todos eles o consumidor é obrigado, a partir dos seis meses da compra, a provar que o aparelho em causa tinha um defeito de fabrico. Na prática, alguns dos problemas mais comuns (nomeadamente baterias que perdem capacidade com o tempo) são sempre considerados parte do gasto natural dos aparelhos.
Medicamentos
8. Sobre a proposta PAN: “Desenvolver acções de sensibilização para a entrega nas farmácias dos resíduos das embalagens e restos de medicamentos”
A Visão diz: Têm sido feitas repetidas campanhas de sensibilização, nos últimos anos. A principal responsável pelas ações é a Valormed, criada em 1999 para gerir os medicamentos fora de uso, constituída pela Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica (APIFARMA), Associação Nacional de Farmácias (ANF) e a Associação de Grossistas de Produtos Químicos e Farmacêuticos (GROQUIFAR), e tutelada pela Agência Portuguesa do Ambiente. No primeiro semestre de 2018, a Valormed recolheu 560 toneladas de medicamentos, e o diretor-geral da entidade dizia em agosto do ano passado que estava perto de atingir os objetivos de recolha definidos para 2020.
O PAN refuta e explica: As campanhas e ações que existem não são suficientes, como o próprio director geral da VALORMED admite. De acordo com a informação disponível, os cidadãos portugueses entregaram a diminuta parcela de 12% dos resíduos de embalagens e restos de medicamentos adquiridos. Atendendo ao escrutínio dos números difundidos, infere-se que foram declarados à VALORMED (sociedade sem fins lucrativos com a incumbência da gestão dos resíduos de embalagens vazias e medicamentos fora de uso) 315 milhões de embalagens colocadas no mercado, correspondentes a 7.462 toneladas de resíduos gerados. Ora, os cidadãos portugueses procederam à entrega de apenas 902 toneladas de resíduos deste cariz (embalagens e restos de medicamentos) – os acima identificados 12% da totalidade dos resíduos comercializados. Se atendermos singelamente à taxa de recolha de embalagens, depreendemos que a mesma cifrou-se em 8%, abaixo do valor de 10% definido para 2016, patente na licença atribuída pela Agência Portuguesa do Ambiente ao VALORMED.
O PAN rescreve, nesta tentativa de refutação da notícia da VISÃO, aquilo que não disse na proposta original. A medida que propõe é “desenvolver ações de sensibilização”, não “aumentar o número de ações de sensibilização”. A formulação no programa eleitoral sugere que é uma ideia própria do partido e que nada está a ser feito nesse sentido. Não se refere que essas ações existem mas que são, alegadamente, insuficientes.
Portanto, o PAN volta a propor o que já existe.
Agricultura
9. Sobre a proposta PAN: “Apoiar através de incentivos financeiros, fiscais e sociais quem pretenda instalar-se como agricultor biológico”
A Visão diz: No programa do PAN, tenta penalizar-se a agricultura convencional e incentivar a biológica, em prol do ambiente. Mas os estudos científicos não demonstram que a agricultura biológica seja melhor para o planeta. Pelo contrário. Uma meta-análise publicada no Journal of Environmental Management conclui, por exemplo, que as emissões de amoníaco, contaminação dos solos e das águas com azoto e as emissões de óxido nitroso são maiores, por quantidade de produção, na agricultura biológica. Esta forma alternativa de agricultura também é menos produtiva, exigindo maior área de cultivo para produzir a mesma quantidade de produto, o que pode fazer aumentar a desflorestação. Segundo um estudo sueco publicado na Nature, a pegada de carbono (emissões de gases com efeito de estufa) chega a ser 70% superior no trigo biológico do que no convencional.
O PAN refuta e explica: Na peça, o que se questiona é se a agricultura biológica é melhor para o planeta do que a agricultura convencional. Novamente, não é indicada qualquer medida já em vigor que esvazie a proposta do PAN, apenas são apresentadas posições diferentes. Recomendamos quem esteja a ler que consulte outros artigos do mesmo autor contra a agricultura biológica. Já o PAN mantém a mesma posição.
Artigos deste autor contra a agricultura biológica:
https://visao.sapo.pt/opiniao/2019-06-05-O-ambientalista-simplorio-1
O PAN prefere, como já havia feito antes, concentrar-se no título da peça (ignorando o lead, que falava em outras “incongruências”), para não responder ao essencial. Além disso, tenta fazer um ataque ad hominem ao jornalista. O primeiro exemplo é um artigo jornalístico baseado no maior estudo feito em laboratório a alimentos biológicos em Portugal (que concluiu que 1 em cada 5 produtos biológicos tinham vestígios de pesticidas sintéticos). O segundo é um artigo de opinião que refere que “a agricultura biológica precisa de mais espaço, valioso espaço, para produzir a mesma quantidade que a agricultura convencional, e que esse espaço terá de ser ganho à custa da desflorestação” – uma afirmação apoiada no que mostram os estudos científicos.
O PAN limita-se a dizer que mantém a mesma posição, ignorando, mais uma vez, a substância deste ponto no artigo e, também, a ciência. Seria proveitoso que o partido indicasse estudos que refutassem, por exemplo, que a agricultura biológica é pior para o planeta no que respeita às emissões de gases com efeito de estufa por unidade de produção e à pressão de desflorestação para acomodar a maior área necessária para a agricultura biológica produzir a mesma quantidade. Não o faz.
5G
10. Sobre a proposta PAN: “Garantir que, antes da implementação da rede 5G em Portugal, sejam elaborados estudos sobre a segurança da sua utilização na saúde humana. Segundo a Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro (IARC) da Organização Mundial de Saúde, a radiação de radiofrequência utilizada pela rede 5G é considerada potencialmente cancerígena”
A Visão diz: Segundo a IARC, a radiação de radiofrequência (qualquer uma, incluindo a emitida hoje pelas antenas de telecomunicações, e não especificamente a de 5G) entra na categoria 2B, de “possivelmente cancerígena”, juntamente com o café, os pickles e o pó de talco. O fumo de lareiras e a carne vermelha encotram-se numa classe acima (provavelmente cancerígenos), enquanto álcool e salsichas estão na categoria mais alta (cancerígenos para humanos). Mas a posição oficial da Organização Mundial da Saúde (OMS) não é a que o PAN indica: “Considerando os níveis de exposição muito baixos e os resultados das investigações feitas até ao momento, não há evidências científicas convincentes de que os fracos sinais de radiofrequência das estações base e redes sem fios causem efeitos adversos à saúde.” Seja como for, nem a IARC nem a OMS alguma vez referiram em concreto a rede 5G como potencialmente cancerígena.
O PAN refuta e explica: Como poderão constatar, esta questão não tem sequer âmbito de acordo com o título desta peça da Visão. Não se vislumbra qualquer referência à medida em termos que possam significar que há já uma medida semelhante implementada. À parte da IARC, que é uma agência da Organização Mundial da Saúde, ter constatado em 2011 que frequências entre 30 kHz to 300 GHz podem ser cancerígenas a humanos em caso de alta exposição. Não é por acaso que a Bélgica suspendeu a adopção da rede 5G devido à falta de estudos relativamente aos impactos da radiação electromagnetica emitida na saúde da população. Mais, a própria Visão já escreveu sobre o assunto, numa peça intitulada “Cientistas e médicos preocupados com efeitos do 5G na saúde”.
A afirmação original do PAN é: “Segundo a Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro (IARC) da Organização Mundial de Saúde, a radiação de radiofrequência utilizada pela rede 5G é considerada potencialmente cancerígena”. Esta afirmação não é correta. Primeiro, porque o termo da classificação da IARC é “possivelmente cancerígeno” e não “potencialmente”. Segundo, a posição oficial da OMS é a indicada no artigo da VISÃO (“não há evidências científicas convincentes de que os fracos sinais de radiofrequência das estações base e redes sem fios causem efeitos adversos à saúde”), enquanto a proposta do PAN dá a entender que a posição da OMS é de que é cancerígeno. Não é.
A conclusão da IARC que o PAN refere agora, de um monograma de 2011, diz o seguinte: “A evidência foi revista criticamente e, em geral, avaliada como limitada entre os usuários de telemóveis para glioma e neuroma acústico e inadequado para tirar conclusões sobre outros tipos de cancro”.
A IARC, acrescente-se, é um organismo muito criticado pelas metodologias dos monogramas em que classifica as substâncias. Entre outras coisas, não é levado em conta o grau de exposição a uma determinada substância, mas sim o potencial teórico que essa substância tem de provocar cancro. Até agora, das cerca de mil substâncias analisadas pela IARC, apenas uma (um tipo de nylon usado nas escovas de dentes) está na lista da organização como garantidamente não cancerígena.
De qualquer modo, não se compreende como o PAN, usando este argumento, não exige a suspensão imediata da venda de pickles, uma vez que estas conservas de vegetais têm precisamente a mesma classificação, na IARC, da radiofrequência: “Possivelmente cancerígeno”.
Água
11. Sobre a proposta PAN: “Avaliar o custo/benefício do recurso à dessalinização da água do mar para utilização na agricultura, indústrias ou limpeza urbana, como alternativa à construção de barragens”
A Visão diz: Dessalinizar a água do mar é um processo dispendioso (várias dezenas a algumas centenas de vezes mais caro do que captar água de rios ou aquíferos), ineficiente e que implica enormes gastos energéticos, como explica na Forbes o professor de Física Richard Muller. Devido aos custos, é particularmente inaplicável na agricultura, setor responsável por três quartos da água total consumida em Portugal.
O PAN refuta e explica: Novamente, não é indicada qualquer medida já em vigor que conflitue com a proposta do PAN, antes é questionada a viabilidade económica do recurso à dessalinização da água, como se o processo de retenção de água através de barragens fosse, por si só, barato…
O artigo da VISÃO não diz que a retenção de água nas barragens é barata. Diz, sim, que o processo de dessalinização é “várias dezenas a algumas centenas de vezes mais caro do que captar água de rios ou aquíferos”. Pode-se acrescentar que é também muitíssimo mais dispendioso do que as barragens.
De qualquer modo, os custos financeiros e o consumo energético da dessalinização são colossais e considerados, pelos especialistas, incomportáveis até para produzir água para consumo humano, que é apenas uma pequena proporção do consumo de água de um país. Mas o PAN vai mais longe: propõe que se estude a dessalinização para a agricultura (que consome 75% da água em Portugal), além da indústria (5%) e da limpeza urbana (incluída no consumo do setor urbano, de 20%).
Se o PAN tem alguma indicação de que a dessalinização é uma opção viável, e não absolutamente incomportável do ponto de vista económico e ambiental, podia tê-lo revelado nesta resposta.