Podemos identificar a origem deste desequilíbrio facilmente. A quebra da natalidade deve-se, sobretudo, à emigração de parte significativa dos jovens portugueses que aqui não encontram condições de vida satisfatórias, mas, também, ao facto de termos uma classe média sobrecarregada de impostos e as classes baixas caídas numa pobreza disfarçada devido a salários de miséria. Juntemos a este quadro o aumento da esperança de vida, de que resulta um país com uma população cada vez mais idosa.
Não vejo em António Costa, Rui Rio ou no discurso dos partidos políticos uma preocupação efetiva com esta situação. O País está a sumir-se pelo ralo do desequilíbrio demográfico e as bandeiras partidárias andam entretidas com a economia, a saúde e pouco mais. Mas para que serve o crescimento económico se ele for conseguido na base dos baixos salários (leia-se salário mínimo)? E para que serve um SNS em boa situação se qualquer dia não tivermos profissionais para trabalhar nele?
A solução para o défice demográfico não pode estar apenas na imigração. Há que criar um programa que contemple condições concretas e objetivas para promover a natalidade. Os esforços que algumas autarquias do interior fazem ao oferecer uns tostões aos jovens que lá se fixarem ou cada vez que nasce um filho são meros paliativos que não resultam, mas constituem o espelho do desespero de quem vê com clareza a situação e não sabe o que fazer para a contrariar.
Há que criar condições para trabalhadores progenitores. Por que razão as empresas que empregam muitos trabalhadores não providenciam as suas próprias creches? E por que motivo as creches em geral não são tendencialmente gratuitas? Há que baixar os impostos às classes sociais com menor poder económico e aliviar aos pais a cargadas despesas com as crianças, desde o material escolar ao apoio às crianças quando ficam doentes. E que disposição tem uma mulher trabalhadora para cuidar dum filho pequeno quando chega todos os dias a casa muito tarde, esgotada depois de oito horas de trabalho e mais quatro de incómodos em transportes públicos, duas no ir e duas no voltar?
Há que criar condições para os casais jovens. É urgente intervir no emprego jovem e no acesso à habitação para que não se vejam forçados a emigrar. Quantos destes casais não se sentam a fazer contas antes de decidir ter um filho e adiam a intenção ou desistem por falta de recursos, em especial os que não podem contar com o apoio de familiares?
Há que criar condições para combater a pecha dos baixos salários. A dura realidade é esta: não se pode pensar em ter filhos quando ambos os pais ganham o salário mínimo, a não ser que tenham ajudas familiares. Além disso muitas vezes numa situação de precariedade laboral.
Há que criar condições para tornar o interior interessante e apelativo para viver. Portugal é um país lindo, mas o interior não atrai quem queira fazer vida lá. Os serviços públicos estão cada vez mais ausentes em nome do lucro imediato e as populações são deixadas quase ao abandono. As aldeias tornaram-se guetos de velhos e as cidades e vilas sem dinâmica e atratividade. Deixo aqui uma palavra de reconhecimento aos que lutam no terreno por mudar as coisas.
Esta secretaria de Estado tinha que ficar na dependência direta do primeiro-ministro e ter uma intervenção transversal no governo, visto que as políticas de família deverão ser pensadas no contexto geral da governação, pois têm sempre algo que ver com economia e finanças, saúde, educação entre muitas outras áreas. Todas as políticas têm que passar a ser pensadas tendo em conta o aumento da natalidade e a recuperação demográfica.
De resto, uma vez que estamos a caminhar para o teletrabalho a passos largos, temos aqui uma excelente oportunidade para rever conceitos sobre o mundo do trabalho que agora se começam a tornar obsoletos. É um desafio para todos, governo, patronato e sindicatos. O governo não pode continuar a encarar o trabalho nos termos do século passado, mas os empresários também têm que atualizar os seus construtos mentais e os sindicatos a sua acção e lutas.
Clamamos por crescimento económico e mais emprego, mas para quem se cada vez nascem menos portugueses? Nos primeiros dez meses de 2021 nasceram quase menos seis mil bebés do que em 2020. Caminhamos para a extinção e parece que todos andam distraídos. Até o papa veio falar disso neste Natal. É tempo de acordar.
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