Estava eu posto em sossego, do meu descanso gozando doce fruto, naquele engano da alma ledo e cego que a fortuna não deixa durar muito, quando me caíram em cima os fragmentos do catastrófico meteorito que tombou sobre o ministro Pedro Nuno Santos. E se eu – cujas responsabilidades face a este Governo se limitam a cumprir as Leis da República – fiquei surpreendido, nem me atrevo a imaginar a cara de João Cepeda, recém-chegado ao cargo de coordenador da comunicação do executivo socialista, ao levar logo de chofre com uma bomboca destas a somar à bagunça em torno do SNS.
Ainda há um mero par de dias a notícia que me surgiu como mais esdrúxula foi a de que as grávidas passarão ter informação online sobre as urgências FECHADAS no portal do SNS. Achei a iniciativa algo inusitada mas gosto sempre de assistir a formas criativas de aplicação da novilíngua. No entanto, eis que logo depois surgiu o anúncio de Montijo + Alcochete, mostrando o nosso vigor económico e a capacidade de Portugal para termos um aeroporto em cada bairro. Achei bem. Ontem, para dar só um exemplo, fui de Lisboa a Aveiro por mais de 60 euros de gasolina mesmo com o desconto do cartão ‘Poupa Mais’. Obviamente, teria sido muito mais barato caso pudesse ter viajado num voo low cost. Pensem só: Se cada cidade, para além de Lisboa, Porto e Faro, tivesse o seu novo aeroporto, seguindo as boas práticas de Beja, o que não se pouparia nos orçamentos das famílias!
Foi certamente este visionarismo que tramou o ministro das Infraestruturas e Habitação e provocou a inveja do senhor primeiro-ministro. Queria contentar os autarcas e as empresas construtoras de todo o país, sedimentando o poder local e dinamizando o tecido económico nacional, começando por anunciar Montijo e Alcochete e depois prosseguir, com anúncios semanais; Viseu e Coimbra, Castelo Branco e Évora, por aí fora… Um “fontismo” do século XXI, um pujante ciclo de desenvolvimento aeroportuário que nos dinamizaria o turismo interno dando o exemplo ao mundo. Os portugueses iriam todos para fora cá dentro nas suas férias, citando um antigo slogan. E os turistas que viessem já não privilegiariam os grandes centros urbanos, podendo viajar com facilidade até às cidades do interior e aí deixando os seus dólares. Só vantagens.
Infelizmente, a política quase nunca premeia os visionários, antes prefere aqueles ministros que, antes de anunciarem o que quer que seja, informam primeiro o seu primeiro-ministro, colegas do governo e deputados do parlamento sobre o que pretendem fazer ou dizer. Pode ser mais cauteloso, mas assim não vamos lá. Pelo menos de avião.
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