O PS, não obstante a sua incontestável vitória nacional – em número de votos e, tudo o indica, de câmaras, podendo reconquistar a difícil cadeira da presidência da Associação Nacional de Municípios – teve, a moderá-la, alguns fracassos que ficam muito mal na fotografia. Pela primeira vez, perdeu na Guarda, não reconquistou o Porto – perante um adversário partido em dois… – e perdeu as duas capitais de distrito alentejanas que detinha.. Pior do que isso, perdeu, para o PSD, o bastião de Braga. Se não ganhar Sintra, é também significativo, porque também ali a concorrência se apresentou fraturada – mas se ganhar este importante município será excelente. Ganhar em Coimbra, Vila Real e Gaia é, também reconfortante. Já a derrota em Matosinhos, ,perante o seu ex-militante e atual presidente, Guilherme Pinto, agora independente, depois de uma zanga partidária paroquial, é uma grande lição para o PS e para os partidos em geral: a mercearia dos lugares, definidos pelo caciquismo das concelhias partidárias, que manobram militantes e resultados, com vista ao futuro tacho, pode ser severamente castigada pelos eleitores. O ar justamente triunfante de Guilherme Pinto diz tudo. “Bem feita!”, só faltou dizer.
Seja como for, António José Seguro passa, à vontade, no seu primeiro teste eleitoral. E esta derrota do PSD e da coligação do Governo é assustadora. Independentemente dos exageros que se fazem sobre “leituras nacionais”, não há dúvida de que esta é uma das maiores derrotas do PSD. As campainhas de alarme devem estar a acender-se na sede da Rua de São Caetano à Lapa, em Lisboa. E estes resultados podem, mesmo, ter reflexos na forma como a troika e os mercados olharão para o País. O Governo não cai já, mas diríamos que fica a prazo, sem a certeza de que resista aos chumbos recentes do Tribunal Constitucional, às exigências da troika e ao puzzle do Orçamento. A não ser, que, paradoxalmente, Passos Coelho ainda possa usar a derrota a seu favor, no diálogo com a troika: “Olhem para estes resultados… Se não houver uma folga, corremos o risco de cair. E isso não é bom para os credores…”, poderá argumentar…
O PSD acaba por ser, inesperadamente, o partido mais mal tratado da coligação. O CDS viu o candidato independente apoiado por si vencer no Porto. Manteve Ponte de Lima com maioria absoluta. E a este solitário bastião, juntou câmaras na Madeira e nos Açores, verdadeiras lanças em África.
Por falar nisso, o reino de Alberto João começa a ser minado por dentro. O líder madeirense é um dos derrotados da noite: o PSD perde 5 dos 12 concelhos da Madeira, incluindo Funchal e Porto Santo. É um murro no estômago para o partido que era, até hoje, absoluto.
Volto a António Costa (ver artigo “Os primeiros protagonistas da noite”) para notar que pode conseguir uma votação equivalente à que foi conseguida, em tempos, por Jorge Sampaio – mas este coligado com a CDU e outras forças de esquerda. A vitória de Costa – por ser tão esmagadora – é, verdadeiramente, o único ponto de preocupação de Seguro. Salva-o, para já, o bom resultado nacional. E Costa não tem pressa.
Por falar em CDU: os comunistas esmagam o Bloco de esquerda num duelo muito particular. Recuperaram câmaras simbolicamente importantes, no Alentejo – embora escassamente povoados – e mantiveram o essencial na cintura industrial, incluindo Setúbal. Aumentaram em número de votos e de mandatos. Um particular em que o Bloco de Esquerda perdeu em toda a linha. Juntando, ao fracasso nacional, uma eventual não eleição de João Semedo, em Lisboa, isso significaria a decapitação da dupla cabeça dirigente do Bloco (João Semedo e Catarina Martins).
Os independentes, entretanto, podem não ter arrasado como se chegou a esperar, mas ganham pelo menos, em câmaras como Estremoz, Matosinhos, Oeiras e Porto. E obtêm votações decisivas em Gaia e em Sintra – se não ganharem, no final da noite, na vila de Eça e de Byron…