A guerra na Ucrânia entrou numa nova fase, potencialmente decisiva, numa concorrência entre três fatores que vão ditar o curso do conflito e, por via disso, o futuro próximo da Ucrânia, Rússia e União Europeia: o reforço rápido das capacidades militares ucranianas; a coesão no aparelho militar russo; o roteiro ucraniano com vista a uma negociação por uma paz duradoura. Comecemos por este, uma vez que dificilmente poderá ser percorrido, nos termos desejados pela Ucrânia, sem que os outros dois fatores fiquem definidos.
O roteiro negocial é maximalista, mas perfeitamente legítimo na reposição da legalidade, da soberania, da integridade territorial e da segurança na Europa. O primeiro ponto passa pela desmilitarização da central nuclear de Zaporizhia e sua monitorização pela Agência Internacional de Energia Atómica. Este é um problema que devia ser prioritário em qualquer capital europeia e alvo das melhores démarches diplomáticas pela segurança continental. Numa fase em que Pequim procura desanuviar a relação com Washington e mostra o seu desconforto com Moscovo, valia a pena incluí-la mais no esforço pela segurança nuclear duradoura. O segundo ponto passa pela extensão sem termo da exportação de cereais através do regular funcionamento dos portos ucranianos, da baixa dos preços dos bens alimentares essenciais, e da estabilidade social nos mercados de consumo mais expostos às disrupções. O terceiro passa por garantir a segurança energética, destruída que está perto de 40% das infraestruturas ucranianas, o que implica uma capacidade de defesa antiaérea capaz de dissuadir os ataques russos intensificados no último trimestre. O quarto ponto implica a retirada total das tropas russas, o que a crer nas suas reiteradas ações não tem grande adesão à realidade. Essa dinâmica precisaria de um momento de extrema fraqueza militar infligida pela recuperação-relâmpago das tropas ucranianas, ou pela insustentabilidade económica e social russa em manter-se nesta guerra, parte da explicação para o que aconteceu no Afeganistão na década de 1980.