O ambiente estratégico mudou radicalmente desde o conceito estratégico da NATO aprovado em Lisboa, em 2010. Na altura, apesar da guerra na Geórgia dois anos antes, os aliados deram à Rússia o benefício da dúvida, aprovando um reset e acomodando o seu perfil agressivo. A guerra no Afeganistão exigia cooperações variadas e o terrorismo do ISIS também. Objetivamente, a presidência de Medvedev iludiu meio mundo e o cinismo pragmático imperou nas avaliações ocidentais. Doze anos depois, pagamos o preço da benevolência, já num ambiente estratégico degradado e em trânsito de uma fase pós-Guerra Fria marcada pelo apaziguamento mútuo entre grandes potências. O conceito estratégico da NATO aprovado agora em Madrid recua para a natureza original da aliança na segurança coletiva europeia, com reforço da presença americana, recentra a ameaça na Rússia e estabiliza a dissuasão como propósito para a década. Não é por dedicar dois parágrafos à China e à sua parceria com Moscovo que a NATO se globaliza. Na verdade, até recua na linha mais globalista que marcou parte do seu debate interno a seguir às guerras nos Balcãs e ao 11 de Setembro, para regressar em força à centralidade europeia, avaliando continuamente a evolução da guerra na Ucrânia. Todos os membros da NATO estão confortáveis com isto.
Neste novo ambiente estratégico, democracias e autocracias tendem a reduzir o nível de interação, fazendo das sanções parte de um processo de dissociação entre economias industriais. Embora saibamos que historicamente as sanções não resolvem conflitos, também percebemos que as seis etapas de sanções impostas à Rússia ainda não alcançaram o seu horizonte mais alargado possível. Podemos, sim, chegar a duas conclusões ao fim de quatro meses de guerra: o Ocidente assumiu o risco de provocar o maior estrago económico e financeiro possível à Rússia; o mesmo Ocidente parece ter assumido os riscos colaterais do corte dos laços económicos, energéticos e políticos com a Rússia. Significa isto que outras autocracias serão tratadas de igual forma, ou por cinismo pragmático acomodaremos relações de dependência sem, com isso, influenciarmos o pluralismo e o respeito pelos direitos humanos, em países como a Arábia Saudita ou o Qatar? Não vale a pena termos ilusões.