Em 2019, depois de tirar Theresa May de Downing Street, Boris Johnson conquistou confortavelmente o partido conservador e o melhor resultado em 40 anos de legislativas, recuperando a maioria absoluta. O mote para esse feito foi só um: resolver o Brexit o mais rapidamente possível. Nem mais hesitações, nem mais rondas negociais com Bruxelas, apenas acelerar a reta final após legitimação nas urnas, beneficiando da fadiga dos Estados-membros com um processo interminável. Assim foi.
É claro que quem tenha estado mais atento à história política de Boris Johnson sabia a fama das suas piruetas, já mal distinguindo o que diz num dia do que fará no seguinte. Esse malabarismo permanente de palco, num caótico figurino que lhe afaga a aura mais bizarra que o elitista sistema inglês alguma vez produziu, foi sempre a sua marca de água. Não seria como primeiro-ministro que iria mudar, muito menos conquistada a maioria absoluta. Porém, essa legitimidade não pode anular uma avaliação política: Bojo faz o que for preciso para contornar trapalhadas, irresponsabilidades, pisadas na ética de um cargo público. É de permanente sobrevivência que falamos. Claro que esta não é uma característica exclusiva, mas torna-se mais evidente à medida que as suas condições básicas para a chefia de um governo deixam de existir. É o caso. Aliás, já era o caso antes de o ser. E, ao contrário do que o resultado desta semana na bancada conservadora parece fazer crer, Johnson não saiu reforçado da moção de censura, apenas lhe sobreviveu para manter um pouco mais tempo uma maioria que, na realidade, já não detém. Só mesmo a irresponsabilidade de um político excêntrico, ou a excentricidade de um político irresponsável, daria cabo de uma maioria absoluta a meio da legislatura, já com o Brexit fechado. Ou seja, a credibilidade, o bom senso e o sentido ético na causa pública continuam a distinguir quem pode e quem não pode estar à frente de um país. E isso é uma das boas lições deste processo.