Na primeira volta das presidenciais francesas, metade dos eleitores votou em candidatos pró-Putin ou em adeptos de um não alinhamento com a Ucrânia, o que na prática vai dar ao mesmo. Um deles, Marine Le Pen, passou à segunda volta com o resultado mais expressivo alguma vez obtido e com condições de competitividade nunca antes reunidas. À entrada para os 15 dias finais da campanha, o intervalo de distância para Macron é suficientemente curto para fazer soar o alarme em Paris e em todas as capitais da União Europeia, com exceção de Budapeste. O cenário de orbanização de França, com Le Pen no Eliseu, existe e deve ser considerado por todos os decisores políticos europeus.
No momento de pressão das democracias pelas autocracias, com uma guerra na Ucrânia sem fim à vista e um Presidente russo que resiste e, pelos vistos, continua a inspirar delfins, é prudente colocarmos o pior dos desfechos em cima da mesa: França mudará radicalmente, o alinhamento com Berlim será esvaziado, Moscovo ganhará peso, Washington será alvo preferencial na antecâmara do regresso de Trump, e soluções comunitárias para travar crises conjuntas serão alvo de retrocesso. A certeza sobre boicotes internos na NATO vai acompanhar o sentimento de dúvida sobre as reais intenções de fazer implodir pouco a pouco a UE, alimentando com isso atitudes miméticas em partidos espalhados pelos Estados-membros, que se verão mais legitimados a fazer o mesmo caminho, fomentando um atrito perigoso em cada debate nacional. A sensibilidade do momento europeu com duplo epicentro em Kiev e em Paris exige que, à semelhança de 2017, quem está fora perceba as implicações daquele desfecho e quem está dentro se mobilize para travar a ascensão vitoriosa da melhor amiga de Putin na Europa.