Com a secção ‘Sociologia do Quotidiano’ pretende-se tratar acontecimentos do dia-a-dia, através de uma análise dos processos do funcionamento e transformação da sociedade, dos diversos comportamentos e práticas (individuais e de grupos) da vida quotidiana, incluindo as interações sociais e políticas, onde se jogam os interesses (que por vezes conflituam) dos diferentes agentes sociais.
No período democrático (pós-1974), Portugal nunca teve um Primeiro-Ministro (PM) e um Presidente da República (PR) tão alinhados politicamente; mais do que isso, amigos e parceiros.
Como diria Max Weber, sociólogo alemão, o António e o Marcelo são dois políticos carismáticos, inteligentes, comunicativos e excelentes estrategistas. Concluíram eles, em 2016, que esta união era benéfica para os dois (mas não propriamente para o povo português). Para o PM, ter o PR ao seu lado é uma garantia de que não será importunado nem contestado na sua opção pela manutenção da captura do Estado (e do governo) por uma elite económica, financeira, política, incluindo a justiça, todos representantes da alta corrupção.
Nesta parceria, o otimista PM faz o papel de ilusionista: engana (ou tenta enganar) os portugueses – os contribuintes, os que realmente sustentam, com o seu trabalho, a descomunal, ineficiente e onerosa estrutura de Estado e de governo -, dizendo que, apesar da má gestão da pandemia, da crise económica, com o sucessivo agravamento do défice e da dívida pública (e privada), o país vai muito bem. É o “António no país das maravilhas”. O facto é que Portugal só ainda não entrou novamente em rutura financeira – lembrem-se que a última (2011) foi num governo socialista (Sócrates) – porque a União Europeia vai pagar quase a totalidade dos estragos sociais e económicos provocados pela pandemia.
O PR, por sua vez, ajuda o ilusionismo do amigo PM, adotando o papel de entertainer, com o objetivo de distrair o povo, para que não pensem naquilo que realmente importa: os graves problemas sociais e económicos, fruto da histórica incompetência e de uma gestão corrupta da “coisa pública”. O PR faz uma leitura minimalista dos poderes que a Constituição lhe confere. Adotando a linha popular (não confundir com populista), prefere as ruas, as feiras, as praias, momentos imortalizados nas suas famosas ‘selfies’. Nesta relação com a sociedade portuguesa, prevalece o Marcelo dos afetos e não o Presidente, na lógica constitucional. Comenta tudo o que não é importante, o supérfluo, discursa e opina como sendo um membro do governo, mas recusa-se a comentar sobre o que realmente importa para o país e para a vida quotidiana dos portugueses.
Esta união entre os dois é para durar. Prova disso é que, num ato inédito na democracia, não respeitando a separação de poderes, um primeiro-ministro é praticamente o mandatário da candidatura de um Presidente da República. Neste caso, o António, dito de esquerda, secretário-geral do Partido Socialista, lançou, em ato público, a (re)candidatura para Presidente o (inofensivo) amigo Marcelo, representante da direita. Os dois amigos ficaram mal na fotografia!
Como era expectável, o António socialista (e benfiquista) não apoia Ana Gomes, do seu próprio partido, por uma razão óbvia: ela defende aquilo que a elite mais teme – uma agenda anticorrupção; e isso o PM não tolera.