Pela primeira vez em 13 anos, o debate da nação faz-se com um partido com maioria absoluta, mas com um governo que praticamente não teve estado de graça. “Depois de quatro meses carregados de histórias, problemas e casos, os temas expectáveis marcaram todos presença: Inflação galopante, caos no SNS, caos no SEF, incêndios, crise política. A oposição afiou as facas e pôs a tónica num Governo sem capacidade de resposta, desorganizado e sem capacidade reformista, o Governo levava cartas na manga e um golpe preparado para contra-atacar.”
“O debate foi um passeio no parque para o Primeiro-Ministro. António Costa é muito confortável neste formato. Se os partidos querem mais debates, é bom que se preparem melhor para eles”, afirma o jornalista Nuno Aguiar.
Nuno Miguel Ropio, jornalista da secção de política da VISÃO, admitiu que “começam a ser preocupantes, ainda que não de alerta já”, os sinais, ou os “tiques da maioria absoluta”, que António Costa mostrou, pela segunda vez, ao não responder a questões dos deputados, ou pelo menos a responder de “forma sintética a um conjunto de perguntas por atacado”. “A par do recorrente anúncio de medidas, parece haver uma nítida estratégia, que já não é a primeira vez que Costa a ela recorre, de desvalorizar as questões das bancadas da oposição”, apontou, admitindo que a falta de clareza sobre as medidas anunciadas pelo primeiro-ministro, que surgirão no outono para fazer face aos efeitos da inflação, pode dever-se a “uma gestão da imagem política de Fernando Medina, visto pelos portugueses nas últimas sondagens como o ministro menos popular, já que o ministro das Finanças vai precisar de brilhar na apresentação do seu primeiro orçamento, uma vez que o que está em vigor, após seis meses de duodécimos, é ainda do cunho de João Leão”.
“Portugal é um país com vários desafios estruturais e um Governo que não parece inclinado para grandes iniciativas e reformas. António Costa é um conservador na atuação e evita ao máximo agitar os equilíbrios existentes”, diz Nuno Aguiar
Para Mafalda Anjos, este debate do Estado da Nação “foi também um debate sobre o estado da oposição”. “Nomeadamente sobre o novo PSD, agora com o líder parlamentar escolhido pelo novo líder Luís Montenegro. E para ele António Costa trazia o golpe preparado. Joaquim Miranda Sarmento, pouco experiente e ábil politicamente, pôs o foco na economia e no ‘empobrecimento e austeridade socialista’. E Costa venceu-o por ko ao ir buscar o seu livro de 2019 onde apresenta q00 medidas para o país, todas elas profundamente austeras, alegando que se trata do regresso do passismo”, diz a diretora da VISÃO.
“Continua sem se perceber a linha política do PSD. Acha que os funcionários públicos deviam ser mais aumentados ou, pelo contrário, há demasiado Estado na economia? Já passámos a fase infantil das gorduras do Estado”, refere Nuno Aguiar.
Sobre a estreia de Miranda Sarmento, Nuno Miguel Ropio também partilhou dessa avaliação: “há um mês que se sabia quem seria o futuro líder parlamentar do PSD, por isso, à exceção dos incêndios que ocorreram nas últimas duas semanas, não faltavam assuntos sobre os quais Miranda Sarmento poderia cavalgar e esgrimir, como o SNS, inflação e combustíveis”. “Mas, enfim, também não seria mais difícil uma estreia, como a de ontem, com tais duas sombras sobre si: por um lado, a de Rui Rio, que o foi buscar à academia para trabalhar consigo, e a sombra do novo líder, que já esteve naquele cargo, brilhando nos anos mais difíceis do parlamentarismo, como foram os da troika”.
Sobre a prestação do BE e do PCP, ex-parceiros do PS, Nuno Miguel Ropio considerou que “a esquerda ainda não encontrou o tom certo pós-gerigonça, quase que se esquecendo que ela própria é uma oposição a António Costa”.
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