A fita da quase crise governamental é extraordinária de analisar, e conterá as explicações para este episódio confuso, e inédito, que envolveu o ministro Pedro Nuno Santos, e o primeiro-ministro. Em menos de 24 horas aconteceu tudo e mais alguma coisa. O ministro despacha dois aeroportos de uma só vez, faz uma conferência de Imprensa, e percorre as televisões e rádios, satisfeito com o que acreditava ser o ponto final na saga dos substitutos da Portela.
Durante todo esse dia só se ouviu, com força, o Presidente da República a dizer que desconhecia essa decisão do Governo, e que queria ser informado. Isso não acendeu as campainhas no Governo, ou no Ministério das Infraestruturas, nem sequer do PM, que estava na cimeira da NATO, em Madrid. Ou eventualmente terá tocado um alarme em António Costa, mas estava passado o dia, sem nenhum incidente.
Tudo terá começado na noite ou madrugada, presume-se. As comunicações entre Lisboa e Madrid deverão ter sido intensas, duras e furiosas, entre PR, PM e ministro, e pela fresquinha, um comunicado do gabinete do primeiro ministro revoga o despacho, invocando a necessidade de consenso com o PSD, no mínimo, a exigência de informação ao PR e, acima de tudo, o respeito pela unidade e credibilidade do Governo, que requer colegialidade nas suas decisões. Pronto, tudo estragado. Há crise.
Ao início da tarde, o PM e o ministro reúnem, e por volta das 17 horas, Pedro Nuno Santos dá uma nova conferência de Impresa: a expetativa mediática, e política, apostava no anúncio da demissão. Errado! Afinal tinha existido uma confusão e falta de comunicação, das quais o ministro assumia a responsabilidade, e pedia desculpas. Assunto arrumado. Sempre foi dizendo que o PM conhecia a decisão, mas que se precipitou. Num dia, só e apenas, um ministro despacha, deixa de ser ministro, e fica como ministro. É confuso, reconheça-se.
Pedro Nuno Santos não percebeu, ainda, que levou uma machadada na sua credibilidade como ministro, e político, e que a partir de agora todos perguntarão se já falou com o PM, e com o Governo, antes de qualquer despacho. Não é saudável. Mas o primeiro-ministro também não sairá intocável desta contenda. O que espanta, nesta fita, é a reação tardia do PM, a desautorização inédita e direta de um membro do Governo, e a fragilidade política em que fica Pedro Nuno Santos. Este enredo tem que se lhe diga, e é água benta para o novo líder do PSD, que assume o cargo já no sábado. Que bela oportunidade para um grande discurso!
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