1.Há três semanas a Agência Europeia de Medicamentos (EMA) qualificava a vacina da Astra como “eficaz e segura”, recusando qualquer ligação com os episódios de tromboembolismo já registados. Alguns países, como o nosso, acreditaram nessa versão, e outros, como a Alemanha e nórdicos, decidiram travar e investigar, concluindo, obviamente, que esse risco era real e direto, embora ínfimo. O chefe da divisão de vacinas da EMA confirmou que existia esse problema, a agência ficou profundamente irritada, e durante 24 horas fez de conta que estava a analisar todos os dados, para concluir o que já todos sabiam. A começar por eles. É preciso ter muita lata para comparar a vacina à pílula. É falta de bom senso, acima de tudo. Ficou claro que a EMA foi obrigada a dourar a pílula. Eles confirmam a ligação, que obviamente é rara, muito, e sugerem uma solução prosaica: a bula tem de conter esse efeito secundário, como se as pessoas pudessem escolher. E disse mais: vai ponderar a recomendação da Grã-Bretanha para não se usar abaixo dos 30 anos. E é com esta vacina que temos de levar. Como sempre, os benefícios superam os riscos. A tese do mal menor. Para nos entendermos, a EMA deveria ter dito isto: a vacina não é totalmente segura, algumas pessoas podem morrer, tem uma eficácia muito abaixo das outras, a bula vai dizer que a morte é um efeito secundário, e talvez não seja boa ideia dar abaixo dos 30 anos. Que sorte a nossa que temos uma EMA assim. Tão eficaz e segura! Ficamos descansados.
2. Os juízes do julgamento dos inspetores do SEF ponderam, ou sugerem, deixar cair o crime de homicídio qualificado do cidadão ucraniano de 40 anos, que aconteceu no SEF do aeroporto, 48 horas depois de chegar ao nosso país. A ideia é passar a ofensa à integridade física grave qualificada, agravada pelo resultado. Estamos confusos. O senhor foi morto ou não? Será que foi apenas morrendo, sem intervenção humana? Será que o Estado português, tarde, mas bem, pagou o que não devia à viúva e filhos? Todos nós, portugueses normais e simples, que não percebem as intrincadas interpretações legais, e as suas invulgares capacidades criativas, só queremos saber uma coisa simples: o senhor de 40 anos foi ou não vítima de homicídio? Morreu ou não? Ou apagou-se, sem mais, e inesperadamente, fora de horas, em resultado apenas de umas pequenas e graves ofensas corporais continuadas? Só mais uma: uma pessoa que foi cruelmente, severamente e fisicamente torturada e agredida, durante dois dias, não era suposto morrer? A chatice de tudo isto foi por causa desse “resultado”? Que incómodo.