O sucesso, até agora, na vacinação dos britânicos, que tem merecido destaques na CNN, entre outros, é o resultado de uma rara tenacidade de Boris Johnson e de uma concentração total num objetivo. Por três razões:
- Estar fora da União Europeia pode ter muitos aspetos negativos, mas o facto é que numa crise sanitária mundial, em que as únicas saídas são o confinamento geral ou a vacina, a Grã-Bretanha está a cumprir as duas exemplarmente: ao dia de hoje tem 23 em cada 100 pessoas vacinadas, sendo que acima dos 70 anos, nas equipas hospitalares e de primeira linha, nos lares e pessoas com doenças graves, todos já estão vacinados. Os britânicos são os terceiros no ranking da vacinação, acima do EUA, e vários países juntos da União não chegam aos milhões de doses já administradas na Grã-Bretanha. À escala, se fosse possível comparar, a 15 de Fevereiro, Portugal já estaria em imunidade de grupo. Temos cinco por cento vacinado, usando o mesmo critério, que é contar a partir da primeira dose. É o que é. Que pena.
- A segunda razão, que deriva da primeira, é que Londres felizmente não estava no mecanismo europeu de compra coletiva, não se atrasou a autorizar o seu uso, e investiu o necessário para ter milhões de vacinas disponíveis. A este ritmo, a Grã-Bretanha terá metade da população vacinada nos finais de Março, início de Abril, e estamos a falar de um país que tem 68 milhões de habitantes. Se Israel já está em imunidade de grupo, com 74 por cento de vacinados, os britânicos atingirão esse patamar no início do Verão. Melhor razão não existe: Boris exerceu diretamente a soberania britânica, e usou o seu poder financeiro. Um Brexit assim, até é bom.
- A última razão, decisiva, foi a concentração total do Governo, e do PM, nesta única hipótese de salvar pessoas, vacinando-as o mais depressa possível. Para isso criou uma task-force mista, com os melhores da administração pública e os top da indústria farmacêutica, e da logística. Sem dramas nem problemas. E estes, por sua vez, criaram e puseram a funcionar uma rede global no país, de cima a baixo, de locais de receção e administração das vacinas, que vai desde igrejas e mesquitas, a estádios de futebol e pistas de corridas de cavalos, só para dar alguns exemplos. Chamaram milhares de voluntários, privados e públicos, indistintamente, e estão a conseguir este feito extraordinário. Num mês e meio, se fossemos britânicos, já estaríamos na nossa vidinha. Que pena. Não dá para invocar a Aliança Luso-Britânica de 1373?
Esta história (e aqui é mesmo História) tem moral: um país europeu sozinho, que nunca perdeu um minuto em aprovar, comprar e inocular, e com uma pandemia com picos dramáticos, em confinamento geral, está a conseguir, a cada hora que passa, salvar a sua população do SARS-CoV2. Os EUA, sozinhos, e com todo o dinheiro do mundo, ainda só vacinaram 15 por cento da sua população, e a UE, no seu conjunto, com o segundo maior PIB do mundo, ainda nem sequer chegou aos 5 por cento (4.7). O fado vadio, amador, já não mora aqui. Está em Bruxelas.