Generaliza-se a confusão sobre o Orçamento de Estado (OE) para 2021. São tantas as alterações, os votos cruzados, as maiorias de circunstância, que o resultado final deixou de ser percetível para o comum dos portugueses. Se na sexta feira tudo correr bem, com o orçamento aprovado, fica-se com a ideia, que não deve estar muito longe da realidade, que Portugal tem dois Governos: o empossado pelo Presidente da República (PR), e o outro que resulta das maiorias aleatórias da Assembleia da República.(AR) Governar assim é não governar. Ou é governar por interpostos. De repente, no final de 2020, o Governo do PS parece a Administração de Trump, ou a que vem aí, de Biden: limita-se a executar o que manda a Assembleia. Há aqui uma inversão do sistema. (É preciso dizer que grande número das medidas introduzidas no OE até são muito boas).
Com a pandemia, a profunda crise económica, a Presidência da União Europeia, e a falta de maioria absoluta, o PS está encostado à parede, cercado pela esquerda e direita, que umas vezes vota em conjunto, contra o PS, e outras alia-se ao Governo para deixar passar trivialidades. Quem Governa o País, afinal? O primeiro ministro sabe que nesta fase pouco pode fazer, com o Presidente sem poderes para dissolver a AR, e já garantiu que nesta situação de emergência não criará um impasse político no país. Ao garantir isso, o primeiro-ministro (PM) entregou-se à misericórdia da oposição. Pelo menos em 2021.
Sendo assim, sem um destino claro do ponto de vista orçamental, o país vai andar aos solavancos. Hoje entram em vigor as medidas do PS, amanhã as do PSD, depois as de todos menos dos socialistas, e no final as que passaram sem ninguém dar conta. De longe, e nesta confusão de votações, o Orçamento que aparecer não é o de Estado, mas de uma Junta de freguesia e da comunidade (sem nenhuma ofensa). É mais um dano colateral da Covid-19.
E a grande ironia é que na sexta feira, o único partido que vai votar garantidamente a favor vai ser o PS, e todos os outros vão variar entre o contra e a abstenção, renegando a versão final, e a sua execução. Não é meu, não tenho nada a ver, o Governo que se amanhe. O socialista, bem entendido. Porque o outro, que apareceu na AR, de conceção extraterrestre, não é para aqui chamado. Existe mas não se vê, decide mas não se assume, vota mas não se responsabiliza.