O que inquieta no Chega, ou assusta, não é André Ventura, um social democrata até há pouco tempo, mas a consciência, a certeza de que existem milhares de portugueses que lhe vão dar uma posição política e eleitoral impossível de disfarçar. O Chega de Ventura percebeu que tinha um mercado, que não é um nicho, e isso reconfirmou-se, agora, nos Açores, e vai ser muito mais visível nas presidenciais, nas autárquicas e nas legislativas.
Portugal não é diferente dos outros países, onde essa direita extremada ganha cada vez mais força, e a culpa, na verdade, não é da democracia. A direita institucional desapareceu nas legislativas, tanto corporizada pelo CDS como por margens do PSD, e qualquer espaço político vazio é rapidamente preenchido.
Muitos portugueses, cada vez mais, pelas mesmas razões que os americanos votaram em Trump, ou os alemães na direita dura e radical, para não falar nos mesmos de sempre, voltam-se para soluções populistas, desertam o centro político, e querem líderes e partidos que oferecem uma mão cheia de soluções e ideias perigosas.
E havendo procura, existindo essa ânsia, era natural que aparecesse um Chega. Vamos colocar as coisas no sítio certo. O tradicional sistema político está gasto, os partidos envelhecidos e sem argumentos, as trocas de poder cabem sempre aos mesmos, e novas e velhas gerações estão fartas.
O Chega, na verdade, é filho bastardo, de ilegítimo, do PS e do PSD (pai e mãe), e tem como tia o CDS, que há quase 50 anos dividem o Poder, agora tu agora eu, com ajuda dos pequenos partidos que se acomodaram ao sistema, e isso está a acabar em Portugal, agora à direita. A esquerda mais extremista foi mais rápida a preencher esse vazio, mas o tempo é indiferente. A vida do Chega está apenas nas mãos do eleitorado, e com tanto palco, dado pelos «pais» que não se assumem, e pela tia distraída, vai atingir patamares que podem decidir a viabilidade de um Governo, como aconteceu agora nos Açores. E noutros países.
Nada de escândalos, por isso. Perguntem aos portugueses por que razão votam, e querem votar no Chega. Foram eles que adotaram este filho não querido, e que vão acarinhá-lo para crescer rápido, forte e exigente. A velha política chegou tarde, mesmo avisada, como é habitual. Agora é o Deus nos acuda.