Um lamento prévio: por mim, Trump e Biden deveriam ter vindo a Portugal, por uns dias, para aprenderem a fazer uma peixeirada à séria. À moda antiga. Com as mulheres, filhos, primos e toda a família envolvida. Cabelos puxados e facas em riste. Com sal e pimenta. Assim, como foi, não passou de uma vergonha. Para os dois.
Quem ganhou o debate? Que debate? Ninguém ganhou, ninguém debateu, e ninguém quer outro debate. Ao que chegaram as presidenciais dos EUA. Um embaraço para os eleitores, e para o mundo inteiro. O modelo está esgotado, os candidatos mostraram o seu lado mais detestável, e os indecisos ficaram na mesma. Como foi, já agora, o desempenho de cada um?
Trump, estava visto e sabido, não iria nunca sair do seu registo. Transformar os 90 minutos num caos. Pressionar, interromper, não deixar o adversário pensar, ser coerente, dizer alguma coisa do princípio ao fim. Bullying puro e duro. Todos sabiam, conheciam e previam que Trump seria igual a ele próprio. Nenhuma surpresa, por isso. Será que ele queria mais? Duvido. Para Trump, neste momento, bastará fixar o eleitorado dele, o aberto e o secreto. As sondagens estão a ficar dentro da margem de erro, o que era impensável há uns meses, há uma semanas, há uns dias, e nesses números não estão os eleitores que não quiseram dizer que vão votar no presidente. Trump só esteve bem em não insultar o seu adversário. Bom, disse que ele não era inteligente, mas isso já sabíamos.
Biden estava, de facto, preparado, mas no pior sentido. Ninguém chama «palhaço» a um presidente em exercício dos Estados Unidos. Muito menos um ex-vice presidente e candidato ao cargo. Mostra uma grande falta de respeito pela pessoa e cargo, que não se podem separar. Não correu bem. Se Trump fosse esperto dizia já que não iria a mais nenhum debate, porque não pode admitir um insulto direto ao Presidente e à Presidência dos EUA. Voltando a Biden: em alguns momentos até parecia que o senhor Alzheimer lhe estava a bater à porta, e não conseguiu apresentar uma única ideia interessante. Foi apenas um candidato reativo às confusões do adversário. E isso, de alguma forma, era o que Trump desejava. Biden só poderia ter agido de uma forma: mostrar, deixar passar, com calma e tranquilidade, uma imagem presidencial, de Estado, e distante dos disparates alheios. Ao ser insultuoso, não ajudou nada. Se era o empurrão que precisava, não conseguiu. Vulgarizou-se, perdeu a cabeça, disse o que não devia, e isso não o favoreceu. Biden tinha de ser um Reagan, ou um Obama. Nem por sombras.
Como vai ser agora? Primeiro convém dizer que até agora já votaram 1.3 milhões de eleitores americanos, e para eles o debate não interessou. E os que ainda vão votar antes de 3 de Novembro, também não mudarão o sentido de voto por causa desta luta de galinhas. Ou das próximas, a existirem. E se alguma das campanhas achava que ia conquistar os 5 por cento de indecisos, o mais provável é não aparecerem, sequer, nas urnas.
Na prática, e na realidade, um debate, ou três, mesmo com a ilusão de ser um momento excecional, copiado por muitos países, não muda o resultado eleitoral. Nunca aconteceu, e não será este o caso. Se, antes desta vergonha, já 78 por cento dos eleitores diziam que não iriam mudar o sentido de voto, então some-se a isso a margem de erro, e na verdade está tudo fechado, decidido, resolvido. Assim sendo, Trump e Biden deveriam acabar já com os debates, para evitar mais figuras tristes. Ou eles aprendem a fazer uma boa peixeirada, ou embrulhem os sacos e voltem para casa.