Técnica milenar de combate, o cerco revelou-se ao longo da História uma das mais eficazes armas de guerra.
Sitiar o inimigo e levá-lo à rendição, cortando-lhe o abastecimento a bens essenciais à vida, tinha, no entanto, outra face na moeda, porquanto as condições a que eram sujeitos os exércitos atacantes acabavam também por se revelar extremas e desgastantes.
Era uma técnica a ser usada após uma análise estratégica muito cuidada, conhecendo as condições do inimigo e antecipando o tempo que o cerco poderia levar antes de provocar um efeito de boomerang no atacante.
A História está cheia de relatos deste tipo de ação militar em que o sitiado se via obrigado a render-se por falta de víveres ou água potável. Há, porém, casos onde os cercos demoraram meses e até anos. Tudo dependia das forças em conflito e da capacidade de resistência de cada uma.
Também no caso dos conflitos bélicos, o tempo acaba por se revelar uma elipse e os acontecimentos de outrora tendem a repetir-se, embora envoltos noutras roupagens.
As guerras já não se fazem em conflitos corpo a corpo, exército contra exército. Os campos de batalha são a maior parte das vezes informáticos e de certa forma virtuais, o que leva a que os ataques sejam comandados à distância e dirigidos cirurgicamente a áreas estratégicas fundamentais
A guerra na Ucrânia está para durar! Há muito se calaram os que afirmavam que seria um conflito rápido de apenas alguns meses. E se opiniões cada um tem a sua, as partilhadas e vertidas como provenientes de peritos na matéria demonstraram a relutância dos políticos e até de alguns militares em aceitarem estas verdades insofismáveis: o mundo, as pessoas, as estruturas mudaram e tentar enquadrar à força as novas realidades em parâmetros antigos é, no mínimo, um erro estratégico crasso.
As guerras já não se fazem em conflitos corpo a corpo, exército contra exército. Os campos de batalha são a maior parte das vezes informáticos e de certa forma virtuais, o que leva a que os ataques sejam comandados à distância e dirigidos cirurgicamente a áreas estratégicas fundamentais.
Nem por isso deixam de ser menos letais, bem pelo contrário.
Atacar centrais de energia é facilitar em muito o trabalho do general inverno que provou, por mais do que uma vez, ser dono e senhor da guerra naquela região. Sucumbiram ao seu rigor exércitos tidos como os melhores e mais bem apetrechados do mundo à época.
Curiosamente alguns analistas militares aos quais foi posta a questão acabaram por menosprezá-la afirmando que o general desta vez joga em ambos os tabuleiros. É de facto não contar com o que são as novas tecnologias e a tipologia atual da guerra à distância.
Nem sequer são precisos grandes ataques com armas às centrais de abastecimento de eletricidade ou gás. Quase que basta um “click” para que todo o fornecimento fique comprometido e com ele se condene à morte pelo frio a população nas grandes cidades ucranianas.
Se bem que ainda agora começou, o inverno adivinha-se rigoroso e fatal, com os movimentos da população que aos poucos fora retornando às suas cidades e vilas, a inverterem-se agora em direção a zonas mais rurais e às fronteiras com a Europa.
O êxodo provocado por este conflito irá assumir nos próximos meses contornos apocalípticos. E a palavra não é vã!
A Europa não consegue chegar a acordo relativamente à forma como deve posicionar-se, por um lado, face ao conflito em si e, por outro, perante a vaga humana que foge.
Nas zonas limítrofes da Europa, a solução parece ser a construção de barreiras, de muros, numa tentativa musculada de manter à distância os deslocados de guerra. É uma solução que não resistirá ao tempo pois a necessidade e o desespero dão a estas populações a força da sobrevivência que, como sabemos, é a maior, a mais errática e imprevisível de todas as forças.
A diplomacia ocidental parece não estar a dar resultados duradouros e o fim não se vislumbra nos tempos mais próximos.
Este é um conflito a fazer lembrar o que há anos se arrasta no Médio Oriente, entre Israel e a Palestina e que tanto sangue já fez correr.
Também aqui os interesses económicos e geopolíticos se confrontam, fazendo das populações reféns dum lado e do outro.
Interessa ao Ocidente que Israel funcione como “estado tampão” naquela região, por forma a travar o avanço árabe. Interessa ao Ocidente em geral e à Europa em particular que o mesmo papel seja assumido pela Ucrânia, por forma a limitar as pretensões imperialistas assumidas pelo Kremlin.
Assistimos a inúmeros pacotes de sanções, mas curiosamente ainda não vimos um apoio claro às eventuais alternativas governativas dentro da Rússia que começa também a sofrer os efeitos do conflito.
No meio deste xadrez político e diplomático estão as pessoas que de política sabem apenas que o pão é negro e escasso, que as bombas silvam em seu redor e que o inverno está à porta pronto a ceifar as vidas dos mais frágeis.
Mas isso agora não interessa nada. Afinal podemos sempre contar com o futebol!!!
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