Quando pela primeira vez falei sobre a eventual (ainda era apenas uma hipótese) invasão da Rússia à Ucrânia, afirmei que não tinha dúvidas de que ia ter lugar e que seria uma guerra longa.
Na altura, muitos foram os que me rotularam de arauto da desgraça sendo este o mais simpático dos epítetos. É sempre mau ter-se razão antes do tempo, bem sei. E sobretudo divulgá-la!
A guerra começou por ser contada em dias, depois semanas e vamos já numa contagem de meses. Com muita sorte, poderemos evitar as contas em anos. Mas, mais uma vez, duvido.
Não creio que seja necessário ser-se um perito em geopolítica em particular e em política internacional em geral, para concluir que, por muitas cimeiras e rondas diplomáticas que se anunciem, o certo é que poucos querem, de facto, o fim da guerra!
Nos poucos meses que leva, o conflito alavancou a economia norte-americana, fez florescer a indústria do armamento, criou fortunas.
Os únicos a quererem desesperadamente o fim das hostilidades são os que lhe sofrem as consequências sem terem qualquer papel na definição de políticas ou qualquer hipótese de decisão.
Kherson, a única grande cidade a ter sido ocupada pelos russos, foi resgatada para o lado ucraniano. Naturalmente grande vitória do pequeno David face ao, não tão grande assim, Golias. Mas… a que preço, em que circunstâncias e com que consequências para as populações?
Não me surpreenderia que, à tomada ou à retomada de cada cidade, se seguisse um tempo de purga. Foi assim em todas as guerras ao longo da História
A Comunicação Social mostra-nos uma população em êxtase face à chegada das tropas ucranianas e acredito realmente que assim seja perante as atrocidades que sabemos ter existido por parte do invasor. No entanto, não mostra o reverso da medalha e esse é perverso.
O instinto de sobrevivência, seja em que condições for, é o último a morrer. Em situação de guerra esse instinto é ainda mais premente, porquanto o risco de vida é maior.
Perante um poder imposto à força, o mais humano é pactuar, calar, passar despercebido… enfim manter-se vivo.
Mas a guerra traz ao de cima, não apenas o melhor, como o pior do ser humano.
Com a reviravolta vem também o tempo das delações, das vinganças, das acusações. São tempos que opõem vizinhos contra vizinhos, famílias entre si, num claro deslaçar das mais elementares teias de solidariedade.
Não me surpreenderia que, à tomada ou à retomada de cada cidade, se seguisse um tempo de purga. Foi assim em todas as guerras ao longo da História. Aliás, muito a medo (a auto censura é a pior das censuras, de facto) vão aparecendo imagens do “outro lado da Lua”. São imagens de vingança, de morte e de crimes…
A delação foi sempre premiada, ou com as boas graças do poder ou com bens. Assim floresceram impérios. Assim, grassou a Inquisição. Assim se fizeram perseguições étnicas. Assim continuamos a comportar-nos.
Quando falamos de crimes de guerra, temos que ser suficientemente objetivos para não cairmos na falácia do discurso do vencedor que tende ser sempre mais intolerante para com o vencido, esquecendo e escondendo, por norma, os seus próprios crimes.
Esta é uma guerra que não está para acabar porque não interessa acabar com a galinha dos ovos de ouros.
Se dúvidas houvesse, a recente encomenda por parte da Alemanha de cerca de 30 caças da última geração, dissipá-las-ia.
Cada um destes caças custa à volta de 150 MILHÔES de euros. Imaginemos o que poderíamos fazer em termos de irradicação da fome no mundo com um tal orçamento!!!
O que poderia ser feito em termos de cooperação para o desenvolvimento em países de economias frágeis! O impulso que poderia ser dado na investigação para a irradicação de determinadas doenças…
Mas não! O Homem continua a considerar-se imortal e centro dum mundo muito seu onde os outros não cabem.
O sangue de uns sempre fez as fortunas dos outros.
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