Algumas das muitas lições da pandemia:
Primeiro: a humanidade é uma só e nenhum vírus reconhece fronteiras.
Segundo: que a solidariedade não é apenas um belo conceito mas uma prática a ser implementada. A velha máxima de “um por todos e todos por um” revelou-se de ouro no combate a um inimigo invisível e desconhecido.
A terceira foi que a segurança tem que ser encarada como um fenómeno muito mais vasto, ultrapassando os limites da criminalidade e abrangendo a questão da saúde pública.
A agenda mediática define a agenda individual e, como tal, acabamos por passar ao lado de fenómenos tão ou mais prementes do que o conflito entre a Rússia e a Ucrânia.
Nas últimas semanas, as infeções por Covid-19 voltaram a crescer, existindo já situações de pressão nos hospitais com um elevado número de internamentos. Aliás o tão falado RT (índice de transmissibilidade), do qual estivemos pendentes durante dois anos, encontra-se neste momento bastante perto dos limites dos maiores picos pandémicos anteriores.
A situação, ao que dizem os epidemiologistas, era de esperar após o desagravamento das medidas de contenção e efetivamente era impossível continuarmos num limbo económico que a breve trecho substituiria uma catástrofe por outra, tão ou mais grave.
Houve um momento em que um grupo de trabalho propôs que fosse inserido, como documento essencial para a migração, um certificado relativo a doenças infetocontagiosas passado pelo país de origem
Dito isto, sou o mais possível a favor dum retorno à normalidade que não será mais aquela que conhecíamos, mas que é a possível e a adaptada à realidade em que nos encontramos. As regras básicas de higiene e de convivência social são, pois, de manter, por uma questão de proteção individual e grupal. Não já como uma imposição, mas como um exercício de simples cidadania consciente e responsável.
O uso de máscara em manifestações, envolvendo um grande fluxo de pessoas, é uma atitude responsável e deverá ser encorajada.
Mas a Covid não é o único vírus a rondar-nos e a exigir um olhar mais atento.
Sobretudo num mundo em que a mobilidade humana, voluntária ou forçada, tende a aumentar cada vez mais, talvez seja a altura de começar a analisar a segurança em termos alargados.
Houve um momento em que um grupo de trabalho propôs que fosse inserido, como documento essencial para a migração, um certificado relativo a doenças infetocontagiosas passado pelo país de origem.
Documento esse, esclareciam, que não podia nunca ser obstáculo à mobilidade da pessoa, mas que servia, isso sim, para identificar e monitorizar a eventual situação de existência de doença. Tratava-se tão somente de proteger o próprio e os demais, garantindo assistência médica adequada e, repete-se, não podendo, em circunstância alguma, ser usado esse argumento para impedir ou protelar a mobilidade solicitada ou imposta.
A velha questão do “politicamente correcto” impediu que essa medida fosse, na altura, sequer abordada.
Mas o mundo mudou de então para cá e talvez seja hora de dar inicio à análise desta questão.
Com efeito, neste momento é tão perigosa a admissão dum indivíduo que tenha cometido um crime e tenha cumprido pena (excecionando-se as situações de crimes de sangue e de terrorismo) como a daquele que transporta consigo uma doença altamente contagiosa mesmo que dela não tenha conhecimento.
Aliás o mapeamento e a monitorização da sua condição de saúde deve ser entendida como um fator de total integração e não de segregação.
Quer-me parecer que está na hora de repensar esta questão objetivamente e sem estados de alma, políticos ou outros.
Os textos nesta secção refletem a opinião pessoal dos autores. Não representam a VISÃO nem espelham o seu posicionamento editorial.