Um filme sobre sonhos desfeitos é, quase sempre, algo a ver.
Quando se alia estes sonhos à imigração e esta ao futebol, aí o interesse ganha novos contornos e abarca uma problemática muito diferente e urgente de analisar.
Nha Sunhu (O Meu Sonho), integrado no certame CURTAS de Vila do Conde, é um filme sobre um jovem que vem para Portugal trazendo na bagagem o sonho de se tornar uma estrela de futebol. Joga a pré-época e depois… bem, depois fica ao abandono, tendo que sobreviver trabalhando numa fábrica até conseguir de novo ser aceite num pequeno clube.
Dos diálogos escorrem as saudades de casa, da família que conta com o seu sucesso para poder aspirar a uma vida melhor. Família alargada, como geralmente acontece em África.
Com o Eusébio sempre no horizonte da memória e no exemplo, são dezenas de miúdos que rumam ao nosso País com contratos temporários para prestação de provas em clubes mais ou menos pequenos.
Dos jogos nas ruas de Bissau ou da Praia para os relvados, o salto é a concretização duma quimera. Alojados em quartos exíguos, a maior parte cedo encontra a dura realidade: Eusébios são poucos e o Rei já morreu
Aqui a solidão é a sua companhia nos treinos noturnos com que tenta atingir o nível que lhe permita conquistar o seu lugar no futebol nacional.
Com o Eusébio sempre no horizonte da memória e no exemplo, são dezenas (para não dizer centenas) de miúdos que rumam ao nosso País com contratos temporários para prestação de provas em clubes mais ou menos pequenos.
Dos jogos nas ruas de Bissau ou da Praia para os relvados, o salto é a concretização duma quimera. Alojados em quartos exíguos, a maior parte cedo encontra a dura realidade: Eusébios são poucos e o Rei já morreu.
Quando falamos de exploração laboral, casos como estes passam-nos bastante ao lado. No entanto, não deviam, já que se trata na sua maioria de jovens menores explorados por agentes e clubes que acabam na construção civil, nas fábricas, abandonando precocemente a escola e lutando contra a saudade. Solitários, juntando-se a outros como eles, vão resistindo e sobrevivendo, enviando para casa o pouco que conseguem retirar do magro salário.
Mas o sonho mantém-se lá no fundo!
O sonho com os aplausos, com o golo que ninguém prevê, com a saída do anonimato que os remeteu para uma terra de ninguém onde nada mais são que meninos perdidos.
O maior combate a travar com estas redes (sim porque existem redes por detrás disto, não duvidem) é evitar ao máximo os vazios legais ou as interpretações discricionárias da Lei.
A maioria destes jovens vêm perfeitamente enganados quanto à real razão pela qual pretendem introduzi-los em Portugal. Fazem-no de forma regular sem dúvida, mas baseada num aproveitamento irregular, já que o objetivo não corresponde ao pressuposto da Lei, ao abrigo da qual entram em Portugal.
Além disso, vêm ao engano, aliciados para uma situação e confrontados muito rapidamente com outra.
Sem dinheiro para retornarem aos seus países de origem, muitas vezes com a responsabilidade de serem os únicos a suprir economicamente as falhas imensas das famílias que ficaram para trás, estes são mais uns dos que ficam esquecidos na frieza das estatísticas.
Nha Sunhu retira-os ao esquecimento. Alerta-nos para uma realidade coexistente, “legal”, mas imoral.
E saber que o filme é fruto do trabalho de jovens cineastas e de jovens produtoras dá-nos esperança no futuro.
Bravo, José Magro. Bravo, João Niza Ribeiro. Bravo, Bagabaga. Bravo, Pântano.