Ser moderado está cada vez mais fora de moda no mundo do bate-boca e da berraria tomado pela comunicação em tempos de internet. Sensatez e equilíbrio, antigamente características bem-vistas, hoje são sinónimo de personalidade sem sal para os fervores e algoritmos das redes. É quase um arrojo teimar em ser equilibrado e não alinhar nas várias correntes totalmente polarizadas que dominam os novos espaços públicos.
Já se sabe: quem queira fazer uma intervenção ou escrever uma opinião que “bombe”, é só radicalizar o discurso. Alinhar em “gritaria”, odiar ou detestar algo, abrir uma polémica ou convidar alguém para um “duelo”, inventar suspeições ou teorias da conspiração em histórias mediáticas são as novas fórmulas para amplificar a mensagem e cativar largas audiências, nas redes e não só, porque os temas transbordam para os meios “mainstream”.
As redes só amplificaram o mundo visceral que sempre existiu onde existiram homens, um mundo de amores e ódios que saem das entranhas sem filtros, sem raciocínio e, na maior parte das vezes, sem lógica. As bocas, as mentiras e as histórias mirabolantes têm agora terreno fértil, porque a maioria das pessoas não pausa cinco segundos para pensar num assunto. “Like” ou “don’t like”, partilha, siga para a próxima. Um mundo onde a emoção se sobrepõe à razão.
Há um tipo de políticos que capitalizam com este assustador mundo novo da superficialidade e do “buzz”, onde a moderação e a profundidade não vendem. Os habituados a mexer com os extremos, que não andam por cá para agradar a toda a gente e não se importam de colecionar inimigos. Os que andam na guerra para dar e levar, e estão preparados para isso. Os políticos que são tidos, por uns, como corajosos e lutadores e, por outros, como perigosos populistas.
Dois deles são agora candidatos presidenciais. Se André Ventura chama a Ana Gomes a “candidata cigana”, ou diz que Mariana Mortágua escreve “sob efeito de marijuana”, a mensagem amplifica-se como bola de neve. Se Ana Gomes fala em “negócio de lavandaria” no Benfica, ou diz que “Portugal se transformou numa máquina de lavar dinheiro” e chama ladrões e corruptos a pessoas sem culpa formada, as declarações vão incendiar os ânimos.
Os dois sabem que o que funciona, hoje, é extremar posições e o jogo da guerra de palavras, do medo, da agressividade – um fá-lo por oportunismo e estratégia concertada, outro por personalidade, idealismo e convicção. Os dois generalizam, metem todos no mesmo saco, passam por cima de formalismos para levar a sua avante. Mas se os dois são populistas, cada um é populista à sua maneira. Os dois odeiam os corruptos, mas André diaboliza todas as elites e atira bocas para o ar para o povo apanhar, enquanto Ana dedicou grande parte da sua vida a combater a corrupção pelas vias jurídicas e legais. André quer deitar abaixo o Estado de direito em nome do povo que o Estado de direito visa proteger e construir um Estado totalitarista, Ana arrasta o Estado de direito pela lama quando, porventura carregada de boas intenções, qual milícia popular, compra guerras e dispara em todas as direções.
Para mal de Marcelo Rebelo de Sousa e do PS e dos moderados “démodés”, é certo e sabido que os dois vão condicionar esta campanha eleitoral. E, temo, não será bonito de se ver.