Há umas semanas escrevi aqui, a propósito dos números inaceitáveis da pobreza em Portugal – uma pandemia que teimamos em ignorar, dizia eu –, que só faltava alguém cometer a tontearia de atirar sopa de tomate para cima dos Painéis de São Vicente, tentando assim chamar a atenção para o problema. Na altura, leitores simpáticos e sensatos aconselharam-me a não dar (más) ideias a espíritos mais inquietos. Têm toda a razão, com os anos que levo de jornalismo já devia saber que a ironia é uma técnica apenas aconselhada a escritores de pena apurada e a humoristas talentosos.
Porque, além de me preocuparem as questões sociais da pobreza e da exclusão social, também me preocupa a salvaguarda do património nacional, acrescento que fico sossegada com o facto de saber que as seis tábuas atribuídas a Nuno Gonçalves continuam a ser restauradas no Museu Nacional de Arte Antiga, num exigente e minucioso trabalho de preservação a cargo dos maiores especialistas portugueses e estrangeiros. Para que fique absolutamente claro: considero que estas ações, além de não beneficiarem a defesa das causas, servem apenas para alimentar a gigantesca amálgama de lixo que, todos os dias, viraliza pela internet e pelas redes sociais fora (e que entretém, concedo, não lhe nego o direito à existência!).