Se em janeiro de 2021 tivemos os piores resultados de sempre quanto ao impacto da Covid (mortos, internados e casos críticos), em janeiro de 2022 batemos todos os recordes quanto ao volume de casos, com valores diários a superar os 60 mil, num processo ainda em expansão. Entramos, de facto, com o pé esquerdo nestes dois últimos anos, mas esperemos este ano dar o justo corretivo a esta epidemia e torná-la, finalmente, uma gripezinha. Parece que as novas mutações do vírus o tornam mais frágil, embora com grande capacidade de contágio, mas o essencial neste combate parece ser mesmo a vacinação, que impede os efeitos mais adversos.
Comparemos, então, o percurso do vírus entre nós, nos meses de janeiro destes dois últimos anos. Importa considerar que as festas natalícias e o potencial de infeção que elas geram não estarão alheadas destas ondas ou picos de janeiro, funcionando como antecâmara do que vem a seguir. Mas, felizmente para todos nós, as consequências do vírus, neste janeiro, ficaram muito aquém do que ocorreu em 2021, mesmo considerando o aumento inimaginável dos contágios:
- Neste janeiro registamos um aumento superior a 1,2 milhões de novos casos, muito acima dos pouco mais de 300 mil registados no mesmo mês de 2021. Mas no ano passado tivemos cerca de 6 vezes mais óbitos (30 óbitos por dia em janeiro deste ano, contra 180 em 2021). O contraste é evidente e prova o sucesso da vacinação que protegeu a saúde das pessoas dos riscos mais catastróficos.
- A comprová-lo, verificamos que neste janeiro, e tomando a média semanal de doentes internados, os valores de existência diária oscilaram entre 1250 e 1963 doentes e em cuidados intensivos entre 151 e 160 camas ocupadas. Em janeiro de 2021, os valores respetivos foram de 3400 a 6600 (internamento) e de 526 a 800 (UCI), entre 3 a 5 vezes superiores. Para além da perda de vidas, estes são os maiores impactos da Covid, que representam doença moderada a grave, risco de vida, sequelas não suficientemente determinadas e custos mensuráveis e não mensuráveis para o Estado, para os profissionais de saúde, para o mercado de trabalho e para as famílias. A vacinação contribuiu decisivamente para os mitigar.
- A idade dos infetados mostra também alterações sensíveis entre os dois meses em análise. Enquanto os cidadãos mais velhos (mais de 60 anos) representavam em janeiro de 2021 cerca de ¼ das novas infeções, em 2022 esse valor baixa, significativamente, para cerca de 10%. Em contrapartida, o volume de casos com menos de 20 anos teve um desenvolvimento inverso: 16% dos casos em janeiro de 2021 e 25% em 2022. O encerramento das escolas em janeiro de 2021 foi por um período superior a 2022 e poderá residir aqui uma parte da explicação. Refira-se, a propósito, que neste último mês de janeiro, com o início das aulas no dia 10, se verificou um substancial aumento do número de casos de covid na população com menos de 20 anos, até àquele dia com valores diários entre 15 a 18% dos casos e, depois, saltando, de forma crescente, para um valor médio diário de 35% no final do mês. O funcionamento das escolas tem, de facto, um reflexo no número de casos, como se comprova, pese embora sem níveis de gravidade consideráveis.
- No que diz respeito aos óbitos é de assinalar a significativa baixa da letalidade no passado mês de janeiro, fruto de dois fatores conjugados – elevado número de novos casos e menor mortalidade. Assim, atingimos uma taxa de 7,4 óbitos por 10 mil infetados (estimativa a 28/01), que compara com o valor de 181 por 10 mil, de janeiro de 2021. É uma discrepância impressionante que atesta bem o efeito protetor das vacinas. A distribuição etária dos óbitos mantém um padrão semelhante entre os dois anos, com os grupos etários acima dos 60 anos a concentrarem 96% dos óbitos em janeiro de 2021 e 93% neste último mês, com os mais velhos (acima dos 80 anos) a representarem 60% agora e 67% em 2021. Importa, todavia, realçar que o número de óbitos acima dos 80 anos foi de 3740 em janeiro de 2021 e de 557 (estimativa a 28/01) este ano, ou seja, cerca de 7 vezes inferior. Mesmo assim, conviria sermos cabalmente esclarecidos sobre os óbitos (bem como sobre os internamentos) de pessoas vacinadas completamente, parcialmente ou não vacinadas e, simultaneamente, sobre as reais causas de morte destes doentes, porque sobra a dúvida se morreram por outras causas, independentemente de serem ou não portadores do vírus. Numa análise sobre a eficácia das vacinas esta informação ajudaria a esclarecer os espíritos mais céticos e a reforçar a credibilidade no processo vacinal. O Ministério da Saúde e a DGS só ganhariam em ter esta informação rigorosa e diariamente recolhida, tratada e divulgada, o que não pareceria difícil. Uma falha inexplicável.
Como nota de mera curiosidade, tivemos eleições no primeiro mês destes últimos dois anos. O percurso do vírus pode ter contribuído para a ausência de alguns eleitores, mas não foi objeto de discussão durante os debates nem parece ter influenciado muito os resultados.
ÍNDICE SINTÉTICO DE RISCO DO VÍRUS DA SARS-CoV-2 (100ª semana:23 a 29 de jan/2022)
Uma nota prévia para situar Portugal no contexto europeu. Com base no relatório do ECDC de 27 de janeiro, Portugal atingiu uma taxa de letalidade acumulada por COVID de 0,80%, que compara, bastante bem, diga-se, com 1,64% na média da Europa. À medida que o vírus vai fazendo o seu percurso, a letalidade vai diminuindo (vacinação, eficácia dos sistemas de saúde no tratamento, mais conhecimento e mais experiência dos profissionais, perda de força das novas variantes). Recorde-se que houve países europeus, entre os mais ricos, com taxas de letalidade acumulada acima dos 16% em certos momentos do percurso do vírus.
A taxa de incidência nos últimos 14 dias foi, na Europa, de 2620,6 casos por 100 mil hab., e em Portugal 4586,5, um valor muito superior, o que nos remete para o 6º pior lugar entre 30 países. Na mortalidade estamos um pouco melhor, com 32,4 óbitos por milhão de hab., nos últimos 14 dias, o 10º pior lugar, bem melhor, todavia, que os 48,5 óbitos na média europeia. Na positividade dos testes estamos com uma taxa de 17,8%, que compara com 13,7% na média da Europa e nos remete para a 15ª pior posição, justamente ao meio do ranking europeu.
Na última semana, assistimos ao agravamento do Índice Sintético de Risco, que é já 4,5 vezes superior ao limite de tolerância do controlo da infeção – o índice 1. Todos os indicadores pioraram, à exceção da existência diária média de doentes em cuidados intensivos, que baixou 2,4% face à semana anterior e está ainda aquém do nível de tolerância pré-estabelecido. É, apesar de tudo, uma boa notícia, que revela menor gravidade dos doentes internados. Atualmente, a percentagem de doentes internados em UCI é de 6,7%, quando no princípio do ano era de 14%, o que confirma a menor gravidade dos hospitalizados. Importa, porque o tema tem sido recorrente nos últimos dias, esclarecer que os números do internamento por Covid, estão aparentemente inflacionados, fruto de uma prática dos hospitais que não é, depois, estatisticamente trabalhada sobre doentes internados pelo vírus e doentes com outras patologias, que foram as que provocaram o internamento (acidentes, AVC, enfarto agudo do miocárdio, diabetes, DPOC, etc.) e que também testaram positivo ao vírus. A crer nas informações avulso que vamos colhendo em diferentes fontes, o número de doentes internados por Covid será bem menor do que é diariamente publicado, sendo um fator desnecessário de alarme que deveria ser rapidamente esclarecido.
.ÍNDICE: 4,57493 (muito elevado)
.TENDÊNCIA: subida
.COR DO SEMÁFORO: vermelha
.DIMENSÃO PIOR: número de novos casos
.DIMENSÃO MELHOR: número de doentes em cuidados intensivos.