1. Eleições, mais do que se ganharem – perdem-se. Em geral é assim, quando está em causa a continuação ou não no poder de uma pessoa ou de um partido: antes de tudo, o resultado do sufrágio reflete a aprovação ou desaprovação de quem está em funções. Ora, embora a situação já lhe tenha sido bem mais favorável, creio que uma nítida maioria relativa de cidadãos (ainda?) não quer a substituição de António Costa como chefe de Governo – e daí o favoritismo do PS nas próximas legislativas.
2. É também por isto, mas não só, que o PS centra a campanha no seu líder e este avisa que caso não ganhe as eleições se demite. Isto é: se demite mesmo que seja possível uma “solução” como a de 2015. “Solução” que seria mais fácil com Pedro Nuno Santos líder do PS. O que, à cautela, para o evitar, poderá levar parte da (importante?) “faixa central de indecisos” a votar no PS e não no PSD…
3. Resultados eleitorais resolvem-se muito “entre o medo e a esperança”. Das muitas eleições que como jornalista cobri, as presidenciais brasileiras de 2002 foram as de mais flagrante vitória da esperança (com Lula da Silva) sobre o medo. Vitória do medo tiveram-na Passos Coelho e a PaF em 2015, tendo como prato forte da campanha a afirmação de que uma vitória do PS levaria o País à bancarrota, obrigando a nova vinda da Troika. Ora, hoje esse papão não funciona, face a um PS de “contas certas” e que até, em nome delas, recusou exigências de BE e PCP para aprovarem o OE. E agora, celebrando a esperança, o PS também usa o medo: uma vitória do PSD significará enorme instabilidade e perigo para a democracia, por via de um qualquer acordo com o Chega…
4. No seu primeiro debate, com André Ventura, e no início do segundo, com Catarina Martins, Rui Rio deu corda a esta vertente da campanha do PS. Mas depois foi sempre melhorando as suas prestações, até ao último, com António Costa, em que estiveram taco a taco – ou até, face às expectativas, com alguma vantagem para Rio. No conjunto dos debates Costa foi mais consistente, mostrando o seu saber e talento políticos, dominando um vasto leque de matérias. Rio distinguiu-se por atributos aqui várias vezes sublinhados: seriedade, sinceridade, imagem de pôr acima de tudo o que entende ser o melhor para o País. A campanha está, de resto, a provar que ele era o melhor candidato que o PSD poderia ter. Se fosse outro, que mormente excluísse a possibilidade de viabilizar um governo do PS, este teria uma assinalável probabilidade de conseguir uma maioria absoluta. Assim…
5. Pode-se falar em maior bipolarização quando nunca houve tantos partidos com representação parlamentar – e dois dos que têm um só deputado, IL e Chega, vão ter mais? Pode-se, no sentido em que tal bipolarização é promovida pelos dois maiores partidos, PS e PSD – e decerto vai aumentar a diferença entre eles e os a seguir mais votados. Qual será o terceiro, é uma incógnita. O Chega, que nas sondagens ocupou destacado essa posição, está em clara queda: quem viu/ouviu André Ventura nos debates a dois, para lá do posicionamento ideológico, tem de ser muito “distraído” ou irresponsável para votar nele. Em contrapartida, o BE está a subir: logo após ter chumbado o OE não ultrapassaria, julgo, a fasquia dos 5%, agora vai melhorando a marca com as prestações de Catarina Martins, informada, boa debatedora e nos frente a frente mais persuasiva do que agressiva.
6. Em clima de bipolarização, avulta a questão do voto útil. Partindo do princípio de que a IL tem já um eleitorado garantido, também por via da competência e eficácia, independentemente do seu conteúdo, das intervenções de Cotrim de Figueiredo, o voto útil afetará sobretudo o CDS e o Livre. O líder do CDS, conhecido por Chicão, até superou as expectativas e decerto contribuiu para que o partido não se apague. Quanto ao Livre seria de elementar justiça a eleição de Rui Tavares, cuja qualidade como deputado só pode valorizar o Parlamento. Mas muitos que assim pensam não temerão que o Livre não consiga eleger ninguém, preferindo votar no PS?…
7. Apesar de tudo, o que resta da campanha ainda é importante e as incógnitas são muitas. Uma das maiores tem a ver com o nível da abstenção, dada a gravidade da pandemia. E estou certo de que a maior abstenção prejudicará sobretudo o PS; e a seguir o PSD.