1. Sobre o chumbo do Orçamento do Estado (OE) e suas muito negativas consequências, indiscutíveis para o País e previsíveis para BE e PCP, escrevi no último comentário. Depois, tendo Marcelo dissolvido o Parlamento, como anunciara, é surpreendente BE e PCP contestarem a sua decisão, porque deveria ter promovido a apresentação de um novo OE.
Como, depois do que, bem ou mal, já tinha anunciado? E para quê? Estariam BE e PCP na disposição de viabilizar o que antes inviabilizaram? Se o Governo não cedeu em tudo o que queriam neste OE, iria ceder no novo? E se a vantagem era haver mais tempo para tentar um acordo, porque é que BE e PCP não permitiram sequer a apreciação na especialidade, que não impedia o chumbo na votação final global?
2. Assim, na situação concreta, a decisão do Presidente foi lógica e adequada. Como o foi a relativa à data das eleições. Aqui chegados, há que olhar e andar para a frente: o País não pode parar, o Governo e o Parlamento continuam em efetividade de funções – e este tem sobretudo de concluir o que tem em mãos. Porque com o fim da legislatura, tudo o que nela se produziu e ainda não foi aprovado perde-se, regressando o processo legislativo à estaca zero.
No caso da eutanásia, a lei até já estava aprovada, tratando-se só de densificar certos conceitos, considerados imprecisos pelo T. Constitucional. Defender, pois, que tal devia ficar para a próxima legislatura, ou seja, voltar tudo ao princípio, raia o absurdo.
3. O maior erro político de António Costa foi dizer que o Governo acabaria no dia em que dependesse do PSD, matando a hipótese de dialogar com ele para, por exemplo, viabilizar o OE. Sobre tal erro, e o do PS fazer agora em relação ao PSD o que durante décadas fez em relação ao PCP (o que sempre critiquei…), escrevi nesta coluna, em 6/8 e 6/10 de 2020. Tem atualidade e o tempo deu-lhe inteira razão…
Nas próximas eleições o PS deve ter, penso, uma posição de abertura à esquerda e à direita. E, sem prejuízo de manifestar preferência por uma solução (com garantias de coerência e consistência) à esquerda, tem de a admitir por igual à direita. De resto, só após os resultados eleitorais, expressão da vontade dos cidadãos, se pode concluir qual a melhor fórmula de governo para o País, que corresponda a essa vontade e seja possível.
4. Nesta ótica não compreendo – a não ser por isso lhe ser vantajoso nas eleições internas do PSD –, que Paulo Rangel recuse à partida quaisquer entendimentos com PS. Não é o que a maioria dos portugueses quer. E, de par com o ser ou parecer mais “político” e de direita, e menos “centrista”, do que Rui Rio, pode ser uma das explicações para o facto de uma recente sondagem da Un. Católica, para RTP/Público, mostrar que Rio é considerado melhor do que Rangel para líder do partido e para primeiro-ministro. E por números bem expressivos: por exemplo, para primeiro-ministro (o que é muito importante numas legislativas), 53% dos votantes do PSD preferem Rio e só 37% Rangel (47%/29% no total dos inquiridos). Mas julgo que isso, ao contrário do que seria natural, terá muito pouca influência nas eleições internas, em que Rangel se afigura favorito.