Ultimamente temos tido de tudo. Ameaças de morte a uma jovem líder dum partido político, difamação torpe e graves insultos à segunda figura do estado português, insultos e ameaças por parte de um juiz suspenso e dirigidos a agentes da PSP em serviço, insultos do mesmo indivíduo aos magistrados do Conselho Superior da Magistratura (CSM), difamação e insultos muito graves a Gouveia e Melo.
Quem chegue agora a Portugal será tentado a pensar que o coronavírus afetou a cabeça de muita gente. Será apenas uma coincidência curiosa ou estamos a entrar numa onda de extremismo?
Recentemente até tivemos direito a um incidente em sede de campanha eleitoral com um casal do CDS em Palmela, a envolver tiros de caçadeira, mas parece que nem GNR nem a Polícia Judiciária estão convencidos de que os disparos tenham sido dirigidos à candidata e seu acompanhante. Do ponto de vista político é curioso que, sendo o CDS politicamente irrelevante no concelho, alguém se tenha dado ao trabalho de intimidar uma candidata que ninguém conhece, e agora, pelo contrário, lá tenha conseguido aparecer nas televisões em virtude do sucedido.
De qualquer modo, o clima está a ficar quente, em grande parte devido aos movimentos negacionistas e anti-vacinas que, apesar de não terem eco significativo na opinião pública, uma vez que a população aderiu em massa à campanha de vacinação e tem colaborado de modo geral com as orientações das autoridades de saúde, a verdade é que entraram numa deriva extremista em nome do direito à liberdade de expressão.
Assim, usam-se da democracia para ameaçar as liberdades democráticas. Tentam condicionar a liberdade de os agentes policiais fazerem o seu trabalho; a liberdade de os juízes poderem cumprir a sua função sem pressões e insultos; a liberdade de o presidente da Assembleia da República poder almoçar em paz com a esposa num restaurante de Lisboa; a liberdade de a líder do PAN poder desenvolver o seu trabalho político livremente; a liberdade de o vice-almirante Gouveia e Melo poder trabalhar à vontade na direcção da task force da campanha de vacinação nacional contra a Covid-19, a importante tarefa que tem desempenhado.
O discurso do medo irracional, das teorias da conspiração, do anti-sistema, a mentira, a histeria, e o apelo à desobediência colectiva e à incitação aos motins seguiram-se aos ataques nas redes sociais. No fundo esta gente está a querer transferir o pior do mundo virtual e de algumas publicações e televisões para o espaço público, apoiados em notícias falsas e na lógica anti-ciência. Uma vez no espaço público trataram de amedrontar crianças à porta de centos de vacinação e de acusar de assassínio Gouveia e Melo.
Um dos quadros mais dolorosos desta telenovela foi ver um médico prestigiado que se notabilizou na medicina humanitária. Foi candidato falhado à presidência do parlamento e antigo candidato à presidência da república, e acabou a proferir um chorrilho de disparates numa manifestação de negacionistas, antivacinas e antimáscaras, onde aproveitou para acusar os colegas de ganharem mais dinheiro pelo trabalho nos covidários. Fernando Nobre enfrenta agora um inquérito disciplinar na Ordem dos Médicos. Não podia ser de outra forma. A vaidade e a sede de poder e protagonismo tem limites.
Não, meus amigos, a liberdade de expressão não é assim tão elástica. O facto de alguém não querer ser vacinado não lhe dá o direito de difundir informações falsas que possam ser perniciosas para a saúde pública, nem de cometer crimes de difamação e insulto.
Goste-se ou não da pessoa, o presidente da Assembleia da República é o segundo mais alto representante do País e quando é enxovalhado em público é Portugal que sofre o enxovalho. Pela minha parte não estou disposto a deixar passar em branco estes crimes. E não, os arruaceiros não são todos tolinhos ou inimputáveis, são concidadãos que estão sujeitos às mesmas leis da república como todos nós, pelo que devem ser investigados, levados à justiça e exemplarmente sancionados.
Por vezes parece que estamos a viver numa espécie de loucura furiosa entre loucos, oportunistas e gente alienada à beira dum ataque de nervos. Bem sei que vivemos tempos estranhos de populismos cada vez mais desabridos, mas creio que o país, a democracia e as instituições têm que se dar ao respeito. Só faltava agora que a praça pública se transformasse no cano de esgoto que caracteriza as redes sociais.
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