Não são só as crianças que têm medo de ir dormir. É um tema sobre o qual se fala pouco, mas os adultos também sentem medos relacionados com o sono, temendo muitas vezes não ser capazes de dormir ou não conseguir obter um sono reparador.
Estes medos associados ao sono materializam-se em comportamentos como adiar consecutivamente o horário de deitar, evitar a cama e deixar-se adormecer fora do quarto, estar mais irritável no final do dia ou só de pensar em dormir. Além disso, são comuns algumas manifestações fisiológicas parecidas com as da ansiedade, desde suores, dificuldades respiratórias, aumento do batimento cardíaco, até tremores ou náuseas.
Todos estes sintomas comprometem o funcionamento emocional, tanto ao longo do dia como durante a noite. Quem sofre deste mal descreve um sofrimento atroz, em especial no período em que não consegue adormecer. É nessa altura que estas pessoas começam a dar voltas e voltas na cama, em grande esforço para tentar dormir à força. Em alternativa, ficam muito quietinhas “a ver se o sono vem mais depressa”, numa expectativa irrealista de que basta termos o corpo imóvel para o sono aparecer.
Outra reação típica é ir para a cama cedo demais, procurando passar mais horas deitado e assim aumentar a duração total do sono. Quando utilizada qualquer uma destas estratégias, o resultado é geralmente desastroso, já que não se resolve o problema central. Quem já sofreu de insónias sabe bem do que falo: quanto mais esforço fazemos para dormir, pior. E quanto pior dormimos, maior a tentação de forçar o sono a vir.
Juntamente com o receio das consequências futuras de dormir mal e de nunca mais voltar a ter um sono de qualidade, estes medos fazem parte do fenótipo das pessoas com insónia, que têm vindo a aumentar sobretudo desde o início da pandemia. Mas as insónias não são o único motivo na base dos medos relacionados com o sono. Quando vivemos situações difíceis durante a noite, ainda que pontuais, podemos ir desenvolvendo resistência à hora de ir dormir. Por exemplo, se tivemos um episódio de paralisia do sono, acordámos com falta de ar ou temos pesadelos recorrentes, é compreensível que o sono seja mais aterrador do que propriamente agradável e regenerador.
Existem também outras questões que podem estar na base das fobias relacionadas com o dormir, como o medo de morrer durante o sono, de sonhar com episódios traumáticos, que aconteça alguma catástrofe ou algo que nos fuja do controlo enquanto dormimos. Nas crianças, se a noite é sentida como ameaçadora, se há inseguranças e sentimentos de solidão e desamparo, assistimos a uma enorme resistência ao sono ou a dificuldades em adormecer sem a presença e intervenção sistemática de um cuidador.
São situações delicadas e que precisam ser analisadas em pormenor. E tal como não funciona dizer a alguém para ter calma durante um ataque de pânico, não vale a pena pedir a quem tem medo de dormir que relaxe e deixe de se preocupar tanto com o sono.
A verdade é que não temos uma receita universal para lidar com todos estes medos, mas é crucial identificá-los e aprender a enfrentá-los um a um. Até porque o ambiente de conforto que favorece o sono não diz respeito apenas à temperatura do quarto e à qualidade do colchão. Importa também ser capaz de alcançar um estado de segurança interior, conseguindo assim dormir verdadeiramente em paz.