Portugal compara muito bem com os países mais desenvolvidos da Europa, contrariando as teorias catastrofistas que temos que diariamente suportar, cá dentro e lá fora. Somos,afinal, um dos países mais seguros como destino, à luz de critérios objetivos. Não vale referir apenas os novos casos de agora, quando há um lastro de incidência brutal, de doentes críticos e de mortos incomparavelmente superior na grande maioria dos países que nos querem neste momento penalizar. Bem percebemos as motivações das críticas, as de dentro e as de fora.
Com o desconfinamento e o inevitável aumento de novos casos, as críticas à condução técnica e política da pandemia tornaram-se mais frequentes e severas, atingindo porventura o climax com as notícias falsas do El País sobre o número de infetados na Região de Lisboa e o pronunciamento nervoso de um autarca, pedindo as cabeças dos responsáveis pelo arrastar regional do vírus.
As motivações para esses destemperos, pondo até em causa a unidade no partido do Governo, parecem mais ligadas à defesa de interesses particulares do que à fidelidade à verdade dos números.
Por isso desenvolvi um ranking que inclui todos os países da EU a 15, o núcleo duro e mais desenvolvido da União. Elegi cinco critérios que traduzirão certamente a preocupação de qualquer cidadão sobre a segurança que cada país lhe poderá oferecer em época de pandemia: qual é a letalidade do vírus? Qual é o peso dos doentes críticos? Qual é o grau de incidência do novo vírus? Qual é o número de novos casos nos últimos 14 dias? Em que medida cada país regista o número aproximado à realidade dos casos?
Para cada critério estabeleci um indicador simples e objetivo que pode ser verificável ou elaborado com base em qualquer publicação estatística internacional sobre o vírus. Dado que se pretende um ranking com uma classificação única e global para cada país, decidi atribuir a mesma importância a cada um dos indicadores. São os seguintes:
a) Número de novos casos por milhão de habitantes nos últimos 14 dias;
b) Número total de casos por milhão de habitantes;
c) Taxa de letalidade (quociente entre o número de óbitos e o número total de infetados);
d) Número de doentes internados em unidades de cuidados intensivos face ao número de doentes ativos;
e) Número de testes para a COVID realizados por milhão de habitantes.
A classificação de cada país é obtida pelo valor médio do somatório das suas posições em cada indicador.
Há quatro países que não publicam resultados sobre os seus doentes ativos (Holanda, Reino Unido, Espanha e Suécia) pelo que são classificados, ex-aequo, em último lugar quanto ao indicador da alínea d).
Os dados utilizados correspondem ao dia 30 de junho e a classificação final é a seguinte:
1º Finlândia, score: 4,40
2º Áustria, score: 5,00
3º Grécia, score: 5,20
4º Dinamarca, score: 6,00
5º PORTUGAL, score: 6,40
5º Luxemburgo, score: 6,40
7º Alemanha, score: 7,20
8º Irlanda, score: 8,40
9º Itália, score; 8,80
10º Espanha, score: 9,00
11º Bélgica, score: 9,20
12º Reino Unido, score: 10,40
13º França, score: 10,60
14º Holanda, score: 11,40
15º Suécia, score: 12,80
Verifica-se, assim, a boa classificação obtida por Portugal, graças, sobretudo, ao facto de ter a segunda mais baixa taxa de letalidade dos países considerados (3,73%) e ao baixo peso dos doentes internados em cuidados intensivos face aos doentes ativos (4ª posição com 0,55%).
Em contrapartida, ficamos em penúltimo lugar no número de casos novos nos últimos 14 dias por milhão de habitantes, critério muito discutível, não só pela sua volatilidade (obrigando a revisões periódicas), mas sobretudo porque nada nos revela sobre a curva epidémica de cada país e o impacto global da infeção na atividade dos serviços de saúde, na gravidade dos doentes e nos óbitos. Um país em apreciação num processo dinâmico de um vírus pandémico com múltiplas vicissitudes e ainda, em grande parte, desconhecido, não pode ser rotulado de seguro ou inseguro apenas por um indicador circunstancial e cuja relevância é muito discutível. E, no nosso caso, a incidência específica do vírus num foco localizado, restringe uma validação universal de um critério tão volátil. De tal modo, que é sabido que muitos dos países que apresentaram excelentes resultados no processo de controlo do vírus estão hoje a braços com pequenos ou grandes surtos, mais ou menos bem identificados, e que provocaram um ligeiro recrudescer do contágio. Estarão, como nós, a pagar o preço do desconfinamento e todos o fazem, como nós, com muito menos casos e muito menor gravidade e número de óbitos. São consequências que todos os peritos bem conhecem e cuja inevitabilidade não podemos contrariar.
Entre nós, criou-se de imediato a ideia de que está tudo mal, de que há culpados, de que faltam meios (a conversa recorrente dos que sempre têm no incremento de recursos a solução para todos os problemas, mas que não apresentam uma única medida de ação que corrija eventuais erros) e de que o controlo da pandemia está a ser incompetente, quando antes era excelente.
Convirá, mais uma vez, olhar para a realidade dos números e perceber que a situação do País, e mesmo na Região de Lisboa, não é dramática. Entre a semana do início da primeira fase de desconfinamento, a 4 de maio, e a última semana de junho, os novos casos a nível nacional tiveram um crescimento médio diário de 9,3% (passando de 328 para 359), o número de doentes internados desceu 47% (passando de 828 para 441), o número de doentes em cuidados intensivos baixou de 112 em média por dia para 71 (-37%) e o número de óbitos passou de 13 por dia para menos de 5 (-63%). E nesta semana em curso (29 de junho a 3 de julho) a média diária de novos casos está a diminuir cerca de 15%, regista-se um aumento no número de doentes internados (+13%), um ligeiro aumento de doentes em cuidados intensivos (+5%) e um aumento médio de mais 2 óbitos diários. A atividade hospitalar mantém-se longe de valores-limite, pese embora se registe alguma pressão nalguns hospitais da Região de Lisboa em UCI, o que é facilmente solucionável com o trabalho em rede, como sempre se faz.
Estou em crer que, dadas as caraterísticas demográficas dos novos infetados do pós-confinamento, estamos perante uma população muito jovem, que eventualmente trabalha, estuda e convive com frequência e com poucas cautelas. Nas últimas semanas, mais de 50% dos novos infetados diários têm menos de 40 anos e entre 2 de maio e 28 de junho o grupo etário dos 0-19 anos aumentou o contingente de infetados em 2,5 vezes e o dos 20 -29 anos cresceu mais de 2 vezes. Em contraponto, o aumento de infetados nas faixas etárias mais velhas (mais de 70 anos) cresceu apenas na ordem dos 35% no mesmo período. O ataque ao surto que hoje vivemos na Grande Lisboa passa, por isso, pela vigilância e atuação sobre os jovens, quer identificando e superando problemas de contágio nos transportes pendulares diários, nos locais de trabalho, nas escolas e nas condições de habitação nas cidades – dormitório e no convívio social, sobretudo noturno. O Estado tem que ter instrumentos de intervenção expeditos que proíbam esses ajuntamentos e as autoridades dos transportes, do Governo e das autarquias, deveriam já ter uma resposta na rua superior à que atualmente existe e que não consegue evitar excessos de lotação nos comboios e nos autocarros. Sobre as condições de habitação, o processo é muito mais complexo porque não há uma informação idónea sobre o tipo de habitação e o tipo e número de residentes, o que só inquéritos associados aos rastreios poderiam esclarecer e contribuir para cortar cadeias de transmissão. Atacar levianamente os responsáveis da Saúde, quando os problemas são sistémicos e obrigariam a um planeamento antecipado de todos estes novos cenários, com o envolvimento de múltiplos agentes públicos e até privados e do setor social, é um processo incendiário sem sentido, desculpabilizador de responsabilidades próprias e que apenas cria insegurança e medo nas populações e desprestigia o país.
Importa, a finalizar, referir o tremendo erro de apreciação do governo britânico, ao considerar menos seguro Portugal do que o próprio país, quando os números apontariam no sentido oposto. A distância de posições entre Portugal (5º) e Reino Unido (12º) é tão expressiva que dispensa qualquer comentário. O Governo britânico continua na sua cavalgada confusa e inconsequente na gestão desta pandemia. Lamentável!
Repito: temos muito bons resultados no contexto da Europa mais desenvolvida, somos transparentes e claros na informação partilhada sobre a evolução da COVID e a última coisa que se espera é que sejamos nós a desvirtuar a nossa realidade e a prejudicar o país num período tão competitivo para o turismo como o que agora se segue.