Vocês desculpar-me-ão a pretensão de dedicar uma crónica aos meus leitores. Sei que soa a bazófia, mas acreditem que tal facto me continua a surpreender tanto como quando surgiu a oportunidade de (re)começar a escrever de forma mais regular.
Deixem-me contar-vos uma historieta. Nos idos de 2000, eu tinha uma amiga que na altura tinha um blog e que terminava sempre os seus textos agradecendo a todos aqueles que a liam “por prazer ou por obrigação”… aquela ideia de que no fundo só te leem os amigos e a família. Eu própria também tive um blog nessa época e recordo de as pessoas que me eram mais próximas me perguntarem pela razão para o fazer, do tipo “mas quem é que te vai ler?”, ou o mais animador “mas tu não tens medo de que te apareça algum tarado?!”.
Não sei se de facto alguém lia aquele blog, não sei se havia por lá algum tarado, às vezes tinha por lá comentários de pessoas que não conhecia, mas na altura era muito comum a malta escrever comentários só para corrigir o português dos autores. A verdade é que me diverti imenso. Como também me diverti a escrever umas dicas de viagem para um blog de viagens de uma amiga que planeava fazer uma sabática. E mais um guia de Santiago para um blog de viagens profissional que pediu colaborações a portugueses espalhados pelo mundo. As crónicas do “Nós Lá Fora” têm sido “a hell of a ride”, quando comecei, há mais de um ano, já não me questionaram “mas quem é que te vai ler?”, apenas um “ai isso é bom, tu gostas de aparecer” e ainda aquele “a mim ninguém me convida”, o que, convenhamos, me pareceu ainda mais preocupante… ser emigrante é uma experiência de vida muito enriquecedora e dá-nos de facto muitas histórias que contar. Estas crónicas deram-me disciplina pela sua regularidade e também o desafio constante de que a próxima crónica deverá sempre superar a anterior. Pelo bem dos meus leitores.
Como é que eu sei que tenho leitores? Porque, para além dos likes que recebo de todos aqueles que me leem “por prazer ou por obrigação”, tenho também recebido ao longo do último ano algo parecido com o correio dos leitores de então. Pessoas que entram em contacto comigo, por mail, via Facebook, por vezes até via LinkedIn, invariavelmente dando como referência algum texto meu que leram. Pode parecer estranho para alguns, mas eu tento responder sempre.
Voltando à época dos blogs, estava eu acabada de me instalar em Madrid, corria o ano de 2004 e recordo que, num momento de arrojo, decidi contactar por mail uma blogger portuguesa que escrevia desde Madrid com muita graça. Nunca me respondeu. O mundo em 2004 era muito diferente do de 2018. As pessoas ainda tinham telefone fixo, eu ainda não tinha Facebook, tinha ouvido falar do Skype, desde logo que não sonhava que viesse a existir um Whatsapp e creio que tinha acabado de descobrir o LinkedIn. A comunicação entre as pessoas era muito menos fluída e muito mais formal. Creio que este é um dos aspetos mais positivos do impacto das redes sociais na vida quotidiana das pessoas. Hoje em dia, já não parece tão absurdo contactar alguém que não conhecemos de lado nenhum para fazer umas perguntas ou pedir referências. Na maioria das vezes, as pessoas que me contactam são pais cujos filhos vêm fazer um intercâmbio numa universidade chilena, um puto que vinha participar num festival de tunas, casais que estão a planear “a viagem” pela América Latina e famílias que estão prestes a mudar-se para o Chile por motivos profissionais.
O Chile é a minha terceira casa, eu sei algo das dificuldades de nos instalarmos numa cidade nova e sei que com miúdos envolvidos na equação, a logística ganha uma dificuldade e responsabilidade acrescidas.
Por vezes não sei responder, tento reencaminhar. Por vezes basta ser amável, transmitir a tranquilidade de que outra pessoa já percorreu o caminho que estão prestes a iniciar e que lhe correu bem, logo também lhes irá correr bem a eles. Faz parte duma categoria de pequenas gentilezas a que nós cá em casa gostamos de chamar por “fazer o Bem”.
Os contactos relativos à questão das escolas têm sido talvez os mais difíceis de responder. Na sequência da última crónica relativa ao processo de admissão na pré-primária, as perguntas tornaram-se um pouco mais específicas. Ora, eu não quero dar demasiada informação sobre a nossa creche ou a nossa escola que possa por em risco a nossa privacidade ou segurança…não vá aparecer o tal do tarado. Por outro lado, a definição do que pode ser uma boa ou má escola depende muito das convicções pessoais de cada um. Ainda assim, creio ter encontrado a forma de orientar algumas das perguntas que me fizeram sobre a questão das escolas.
Poder chegar até às pessoas tem sido muito positivo. Foi um bónus. Também já tive um hater. Agora estou realmente a gabar-me, na verdade o hater não era só meu, era do grupo dos Portugueses no Chile no Facebook. Sentia-se infeliz no Chile e acabou por ser convidado a sair do grupo. Ser emigrante dá-nos de facto muitas histórias que contar, mas nem sempre é fácil ou bonito e é preciso saber partilhar.
VISTO DE FORA
Dias sem ir a Portugal: 1 ano e 3 meses aproximadamente…
Nas notícias por aqui: A rivalidade Ronaldo – Messi no Mundial da Rússia.
Sabia que por cá…. Diminuíram a duração da luz vermelha em 1200 semáforos de Santiago para reduzir o risco de exposição a assaltos.
Um número surpreendente: 40 sacerdotes condenados por abusos sexuais a menores no Chile, 18 no âmbito de processos julgados em tribunais civis e 22 em processos decorridos perante tribunais eclesiásticos.