Como parte do meu trabalho, acontece às vezes, ter a oportunidade de fazer divulgação de ciência e tecnologia ligados ao Espaço. Recentemente fui convidado a estar algum tempo com miúdos de origem Portuguesa, que vivem nos arredores de Frankfurt. Era um grupo de cerca de 25 crianças, com diferentes níveis de habilidade em falar o Português, e todos mais ou menos entre os 7 e 12 anos, de ambos os géneros. Alguns eram filhos de pais Portugueses ou Brasileiros, mas nascidos cá, outros tinham chegado há pouco tempo e estavam ainda em adaptação.
O formato da sessão era em estilo de speed dating: os alunos foram divididos em 4 grupos, e cada um desses grupos ficava 15 minutos com um dos 3 cientistas de língua Portuguesa convidados. Além de mim, estava a Rute, de Lisboa, que trabalha há já 10 anos na BASF, em Ludwigshafen, e investiga como bactérias e fungos podem ajudar as plantas a crescer fortes, e o Gabriel, do Rio de Janeiro, que está a fazer o doutoramento em Biologia, mais especificamente sobre o DNA, na Universidade de Heidelberg.
Para mim, era a primeira vez, e confesso que não sabia bem o que esperar. Lá fui equipado com um modelo dos meus satélites, muitos posters da Agência Espacial, um PowerPoint a explicar muita coisa, e um rolo de papel e marcadores. Encontrei a Paula, a coordenadora da organização Native Scientist (já falo deles daqui a pouco), responsável pelo evento, e as duas professoras de Português, a Cristina e a Dina (há já muitos anos a ensinar português a crianças aqui na Alemanha) que tinham reunido entre elas um grupo de alunos de duas escolas diferentes. Falámos um pouco sobre as condições do ensino na Alemanha, e sobre as condições e dificuldades dos miúdos com origem estrangeira.
Depois chegaram os miúdos. Alguns tinham estado a jogar à bola e vinham com a cara vermelha. Todos excitados. Organizaram-se automaticamente em grupos de acordo com a sua já estabelecida afiliação e ocuparam as mesas. As professoras introduziram a sessão e os cientistas e depois mãos à obra. Eu tinha as coisas todas prontas. Comecei por perguntar os nomes dos alunos, e logo me pus a tentar perceber o que sabiam sobre o espaço… Para minha surpresa, não sabiam quase nada. Então, peguei no papel e nos marcadores e comecei a falar dos planetas e das estrelas, dos foguetões para levar coisas para o espaço e dos porquês de se fazerem satélites. Mostrei-lhes uma foto da nossa região tirada do espaço e pusemo-nos a descobrir as coisas que conhecíamos: o aeroporto, a cidade de Frankfurt, o estádio do Eintracht, o Rio Reno e o Meno, as autoestradas, as montanhas, os campos agrícolas… Muitos bem atentos, outros de braço levantado à espera da sua oportunidade de fazer uma pergunta, outros envergonhados, e outros desavergonhados. De repente, os 15 minutos estavam a acabar e eu com ainda tanta coisa para falar com eles…
No fim distribuímos certificados e posters e todos estavam contentes. Tinha sido algo especial e diferente das aulas normais.
A Native Scientist (www.nativescientist.com) surge quando uma das fundadoras, a Joana, cientista portuguesa a estudar bactérias no i3S, constatou, quando morava em Londres, que as comunidades imigrantes tinham sérias desvantagens em termos de oportunidade de acesso e motivação para a educação com vertente científica e tecnológica quando comparadas com os seus colegas nativos. E resolveu juntar crianças com cientistas, todos emigrados, que falam a mesma língua de herança, e, dessa forma, abrir horizontes e combater a desigualdade educacional. Entretanto, a organização cresceu e está presente em muitos países Europeus (Inglaterra, Escócia, Irlanda, França, Alemanha e Holanda) e apoia diversas comunidades migrantes (não apenas a Portuguesa) promovendo este tipo de eventos em escolas. Fiquei muito impressionado pela qualidade e profissionalismo na organização do evento, e pela maneira como os coordenadores estabelecem e nutrem as relações com os cientistas, com os professores e com as crianças.
Aqui fica o apelo aos meus co-expatriados cientistas e tecnológicos que possam estar a ler a crónica: se querem ter um pequeno impacto nas possibilidades de crianças da vossa nacionalidade, nos países onde estão, enveredarem por uma carreira científica, podem associar-se à Native Scientist para lhes dar inspiração e motivação. Em retorno receberão muita apreciação e alegria dos professores e alunos.