A 2 de setembro de 2014 aterrei no Japão pela primeira vez. Cheguei com a mesma inocência e receptividade de uma criança que aprende a ler e a escrever.
De pele bronzeada e sarapintada pelo sol do nosso país, acalentada pela família, amigos e colegas, abandonei a minha zona de conforto e dei a mão a um amor de há 20 anos. “Deixei tudo por ele, deixei, deixei…” fez parte da banda sonora da maior mudança da minha vida.
A independência outrora alcançada – emprego estável, casa, rotina diária de ginásio – ficou para trás e o núcleo duro que me rodeava viu-me partir. De coração pequenino, mostraram-me que o que me desejam é muito superior ao egoísmo de me quererem em permanência nas suas vidas.
Cheguei a Nagoya às 23h depois de uma longa viagem de cerca de 20 horas – Lisboa, Dubai, Osaka – mais três horas de autocarro até à minha nova morada. No aeroporto dividiam, ordeiramente, os residentes e os turistas. Falavam como se entendesse japonês na perfeição.
Já na estação de comboio para casa ouvi passarinhos por todo o lado e o silêncio absoluto das ruas deu-me a quietude de quem chega para ficar.
Já instalados, saímos à 1h da manhã para fazer as primeiras compras para casa a um supermercado que está aberto 24h.
Enganem-se os que julgam que no Japão só se come sushi e arroz. Das frutas e legumes à carne, peixe e padaria, passando pelas prateleiras cheias de produtos de higiene e alimentação criteriosamente arrumados, apercebi-me que “só” precisava mesmo de aprender a ler os rótulos e etiquetas, mas que fome não ia passar.
Seguiram-se dias de passeio debaixo de um sol quentinho.
Nagoya é a quarta cidade mais populosa do país e, com mais de 2 milhões de habitantes, é o maior centro urbano da região de Chubu. Situada entre Tóquio e Quioto, tornou-se também o centro económico desta zona.
As ruas da periferia são tranquilas e por cá as bicicletas são rainhas. Toda a cidade é plana. As casas parecem carecer de plano urbanístico e estendem-se em tons de cinza, assim como os prédios. Unidas por cabos de eletricidade mal amanhados, parecem saídas de um filme do Tim Burton. Quase todas têm plantas à porta ou pequenos jardins de árvores e flores primorosamente cuidados. Frequentemente, encontramos pequenos templos escondidos por entre as habitações.
Já no centro da cidade a arquitetura é de vanguarda e obriga-nos a pôr os olhos no céu para ver o topo de cada prédio. Aqui também reina o silêncio nas ruas e continuam a ouvir-se os passarinhos. Todos os passeios têm rampas, sinalética para peões e ciclistas, o que permite total mobilidade para quem se movimenta em cadeira de rodas ou, no meu caso, com carrinho de bebé.
Nas estradas os carros circulam à esquerda e os semáforos distam muitos metros da zona onde se tem de parar. Conduzir por ali dá-nos um verdadeiro entorse no cérebro!
Dois meses após a minha chegada fui tirar a licença para poder conduzir. Muitos comprovativos e burocracias depois, bastou-me fazer um teste de visão para estar apta a circular ao contrário.
A maioria dos carros são híbridos e a condução é muito ordeira e cautelosa. Os semáforos são escrupulosamente respeitados e cada obstáculo ou cada obra que está a ser feita na estrada é sinalizada a 500 metros de distância com pinos, bandeirolas e pessoas a esbracejar.
Neste campo, uma das maiores diferenças que encontramos em relação ao nosso país é o estacionamento que não é gratuito e não contempla beira de estrada nem passeios.
Os japoneses são de uma humildade e simpatia ímpares. Sempre prontos a servir bem e a ajudar, vão connosco até onde for preciso para nos mostrarem o que procuramos, seja na rua, num supermercado ou numa loja. São muito poucos os que arranham o inglês e os que o fazem soletram as palavras timidamente com receio de as dizerem mal, mas isso não nos impede de comunicar (recorrendo à mimica).
Embora tenha tirado um curso intensivo de japonês no verão de 2014, deparei-me com esta barreira linguística altamente acentuada. O meu “portunhês” carecia, urgentemente, de um trampolim. Para isso contei com as preciosas aulas em japonês-inglês de uma amiga nossa.
Atualmente, apesar de tamanha dificuldade de comunicação, consigo entendê-los e fazer-me entender naquelas que são as voltinhas do dia-a-dia. Para assuntos pessoais e médicos: tradutor precisa-se!
Estas e tantas outras curiosidades irei falar-vos mais à frente. A cada dia sinto que levo uma injeção de educação e de saber estar, que tenho muito para dar e tanto ou mais para aprender. O Japão é um país cheio de contrastes e de histórias.
Façam a mala e sigam-me nesta deliciosa viagem!