Os resultados dos atletas portugueses em Jogos Olímpicos despertam sempre debates acesos e polémicas acaloradas. Em especial desde que, há já quase quatro décadas, Carlos Lopes e Rosa Mota demonstraram a uma nação inteira que, afinal, também nós podíamos ganhar e alcançar o lugar mais elevado do podium. De ânimo leve e de verbo fácil, uma pergunta passou, no entanto, a ser repetida em todos os ciclos olímpicos: se já mostrámos que podemos vencer, porque é que não vencemos mais vezes?
A pergunta é aceitável e pertinente, em especial quando vemos outros países mais pequenos e atrasados do que o nosso a ultrapassarem-nos na contabilidade das medalhas. É preciso perceber, de facto, porque é que isso sucede. O problema é que essa resposta não pode ser dada apenas pela análise do desempenho dos atletas que estão a representar o País na maior e mais global competição do planeta. Mais do que olhar, porventura, para quem vemos correr, nadar ou saltar na televisão, temos de começar seriamente a olhar para quem, deste lado, sentado no sofá, vibra com as conquistas, mas também raramente perdoa as eliminações precoces, mesmo que esse atleta tenha acabado de ficar entre os oito ou 12 melhores do mundo (quantos de nós podemos dizer o mesmo a nosso respeito?).
Há um estudo recente, elaborado pela consultora PwC, a pedido das três principais entidades desportivas do País (Confederação do Desporto e comités Olímpico e Paralímpico), que permite esboçar o nosso retrato coletivo em termos desportivos e de atividade física. E o que vemos nos números desse relatório é que somos, sobretudo, um país de Olímpicos de sofá, em que 55 a 60% da população tem excesso de peso (a quarta taxa mais elevada da OCDE), em que 67% das pessoas não praticam qualquer atividade física e em que 51% delas passam os dias sentadas a trabalhar, sem qualquer esforço ou atividade motora capaz de exercitar os seus músculos ou articulações. E todos estes indicadores pioraram entre 2014 e 2019. Ou seja: a tendência, também devido ao próprio envelhecimento da população, é para termos um País cada vez mais sedentário.
Com a pandemia, este cenário agravou-se, segundo o mesmo estudo. No curto espaço de um ano, por exemplo, diminuiu em mais de 100 mil o número de praticantes de desporto. Ao mesmo tempo, acabaram mais de três mil clubes – cruciais, em tantos casos, para manter jovens ativos. E, embora o financiamento público do setor tenha vindo a aumentar para valores próximos dos tempos da pré-Troika, a verdade é que ainda continuamos muito longe dos registados pelos Estados europeus que, no fim das competições, apresentam os melhores pecúlios de títulos e de medalhas. Enquanto, por exemplo, Portugal gasta uma média de 69 euros por habitante nas chamadas atividades recreativas e desportivas, a média europeia é de 119 euros. E países relativamente da mesma dimensão do nosso, como Hungria e Holanda, investem 164 e 217 euros, respetivamente.
Neste panorama, será que basta ver um atleta sagrar-se campeão olímpico para fazer despertar o interesse dos jovens em tentar seguir o seu exemplo? É importante, mas não chega. Como também não basta injetar dinheiro à toa e esperar que os resultados apareçam. Um estudo britânico recente, no Reino Unido, revelou que a realização dos Jogos Olímpicos de Londres, em 2012, não conseguiu alcançar um dos seus objetivos principais, que era o de fazer aumentar para os níveis desejados a atividade física da população, apesar da euforia vivida nesses dias, com os momentos de glória dos seus heróis olímpicos. Para o conseguir, é preciso, acima de tudo, construir um ambiente propício ao desenvolvimento desportivo, dizem os autores desse estudo. E isso passa por três fatores: criar motivação, aproveitar a oportunidade e, depois, permitir o acesso aos equipamentos desportivos, às equipas, aos treinadores. Nisso, as escolas desempenham um papel fundamental, mas também as políticas públicas e as empresas. A conclusão é simples: se aumentarmos os níveis desportivos e de atividade física, aumentaremos as hipóteses de ver mais atletas nos Jogos Olímpicos – e não no sofá.