Bem sei que as férias escolares estão aí, vai tudo a banhos e, à boa maneira portuguesa, enquanto o pau vai e vem, folgam as costas. Preferimos nem pensar muito no tema das escolas, porque até setembro sabe-se lá o que vai acontecer, e depois disso logo se vê. Nada mais errado. Andamos a fugir da questão há meses, com algum facilitismo: vamos tarde e vamos mal nesta matéria. Faltam respostas e indicações concretas. E se há tema que tem enorme impacto, transversalmente, em toda a sociedade é este: o que fazer com os nossos filhos daqui a dois meses?
Vamos por partes. A abertura ou o fecho das escolas tem enorme impacto pandémico, como um pouco por todo o mundo se percebeu (só os peritos portugueses fechados lá no seu Conselho Nacional de Saúde logo no início ouvidos entenderam o contrário, mas adiante). Este é o sítio onde há maior índice de concentração diária de pessoas, fechadas em espaços pequenos, e pessoas estas que, por definição, são potencialmente irresponsáveis e pouco cuidadosas. Pensar, por exemplo, que usam sempre a máscara corretamente é uma ficção. Miúdos que vivem ou contactam com os seus agregados familiares, que muitas vezes estão entregues aos avós, potenciais grupos de risco, e que andam de transportes públicos. Vamos ser claros: abrir ou fechar escolas é das decisões com maior impacto na evolução do temido Rt, a taxa de contágio do vírus.
Por outro lado, o papel das escolas na sociedade é muito maior do que ensinar a matéria aos alunos. É também um importantíssimo local de socialização, cidadania e empatia, de acompanhamento social, de apoio aos mais desfavorecidos. É, nunca é demais relembrar, nas escolas públicas que muitos miúdos têm a sua única refeição decente do dia.
Por fim, a decisão da abertura das escolas impacta a vida de muitos milhões de portugueses. Sobretudo dos pais, que terão de se organizar nas suas rotinas diárias e profissionais: Vão ou não poder trabalhar nas empresas ou terão de ficar em teletrabalho os que conseguirem? Com quem deixam os miúdos? Terão atividades? Mas também dos professores, que têm de se adaptar e organizar nos seus métodos de ensino. Precisam de se equipar e preparar para reforçar as competências de ensino à distancia, ou nem por isso? Terão as condições de segurança necessárias?
É verdade que convivemos com inúmeras incertezas. Não se sabe como vai o vírus evoluir, como será o comportamento no verão e no início do outono. Mas as respostas e orientações do Ministério da Educação sobre a abertura do próximo ano letivo têm sido poucas e demasiado vagas. Informou-se que o ano escolar pode reabrir com aulas presenciais, à distância ou em regime misto, ou seja, está tudo em aberto. E, de acordo com as indicações mais recentes, deve ser garantido, “sempre que possível”, o distanciamento de pelo menos um metro entre alunos. Uma exigência menor do que a que era recomendada anteriormente, que era de 1,5 a 2 metros. Com o tamanho de turmas que há hoje, tanto no público como no privado, quais são as escolas que permitem este distanciamento? Terão as turmas de se desdobrar? Mas como, se os horários já estão sobrecarregados?
Com a evolução pandémica que se adivinha, não me parece possível um regresso 100% presencial. E não vejo que exista melhor alternativa do que as escolas reabrirem num regime misto. Com aulas presenciais e com aulas à distância. Mas, tal como acontece nas empresas, alternariam por turnos: metade das turmas vão à escola numa quinzena, a outra metade na seguinte, rotativamente, e os alunos que não vão à escola acompanham pela internet. Assim garante-se uma muito menor concentração de alunos nas escolas (e uma mais eficiente despistagem caso ocorra algum contágio), e ao mesmo tempo, liberta os pais pelo menos metade do mês para recuperarem as suas rotinas normais. Não é o ideal, mas é a solução que melhor coordena todos os interesses em causa. Não vai ser fácil, e é por isso que é melhor começar desde já a trabalhar no cenário mais provável. Tudo isto deveria ficar definido o quanto antes, pais e professores serem informados o mais depressa possível, e não ser improvisado em cima da hora (e do joelho) em setembro.