A burla “olá pai, olá mãe” já rendeu mais de um milhão aos seus autores. Antigamente os burlões batiam à porta de idosos nas aldeias, fazendo-se passar por um primo da Suíça; agora, que estão em teletrabalho, conseguem fazer-se passar por membros da família nuclear, e extorquir dinheiro a seniores da cidade. É uma assinalável democratização da fraude. Estes idosos acham que não vivem isolados, porque estão em 17 grupos de Facebook, e que não são sequer idosos, porque têm Instagram. Mas o facto de obedecerem às ordens de desconhecidos via WhatsApp é prova irrefutável de que são mais velhos do que gostariam de ser. Não quero, claro, pôr o ónus nas vítimas, nem dizer que os nossos pais “estavam a pedi-las” só porque se puseram ao fresco, a instalar apps nas quais não sabem mexer. Espanta-me é que as mesmas pessoas que nos ligam para dizer que não sabem do PUK, se abalancem a fazer uma transferência sem nos perguntarem nada antes. Se os atendemos às sete da manhã para os ensinar a usar emojis, também podíamos esclarecê-los acerca dessa mensagem em português macarrónico, a exigir uma espécie de resgate. Ter pais que caem neste engodo é, ao mesmo tempo, comovente e insultuoso. Comovente porque o amor que sentem por nós se sobrepõe a qualquer racionalidade, insultuoso porque nos acham capazes de 1) sendo já adultos, pedir dinheiro aos papás como se tivéssemos onze, 2) escrever “conseguis fazer um favor para mim? Não tou conseguindo acessar a minha aplicação”. Eles gostam muito de nós, mas veem-nos como totalmente dependentes e semi-analfabetos. De facto, os pais vêem sempre os filhos como bebés. Se os burlões se fizessem passar por nós a pedir VHS do Tom Sawyer e um carregamento de CapriSonne, eles acediam sem pestanejar. Fico preocupada com a possibilidade dos meus pais virem a ser abordados por este tipo de aldrabão. Não tanto pela saúde financeira deles, mas sobretudo pela saúde mental dos meliantes.
‒ Olá, pai, meu telemóvel partiu a viseira e tive de deixá-lo na assistência.