Semana dura, esta, para quem é apreciador de moderação e de futebol (não necessariamente por esta ordem). A extrema-direita no Parlamento viu as suas fileiras aumentar consideravelmente e a extrema-esquerda do FC Porto perdeu o seu melhor soldado. First things first, como dizem os malditos ingleses que levaram o Luis Díaz: os portugueses manifestaram nas urnas não só o desejo de manter o primeiro-ministro (perceberam que um titular não se troca assim no mercado de Janeiro), como a vontade de sair de casa. A abstenção foi mais baixa nos concelhos com mais Covid, o que prova que quando se está isolado qualquer programa parece boa ideia, até os programas eleitorais que não lemos. Os resultados provam também que os eleitores preferem a extrema-direita à direita extremamente divertida. Chicão fez sketches, Rio foi chistoso na TV, nenhum dos dois caiu em graça, mais valia não terem sido engraçados. Enquanto isso, na ala esquerda vivem-se dias felizes. Costa está feliz por ficar, Díaz feliz por partir. O colombiano foi vendido ao Liverpool por 45 milhões de euros, mais 15 em objectivos. Esta fórmula devia aplicar-se a tudo. Fosse para comprar pão (pago-lhe agora 50 cêntimos, mais 10 objectivos, se a açorda ficar boa), ou na política: não lhe dou já a maioria dos deputados, dou só 100, mais 17 se mostrar que está mesmo aberto ao diálogo. Depois de consumada a transferência de Díaz, os sócios reclamam porque foi um mau negócio. Se fosse bom, o meu desalento era igual. É-me indiferente quanto é que facturam, eu gosto é de ver os jogadores a facturar. Saudades do tempo em que o descontentamento nas bancadas tomava a forma de “palhaços, joguem à bola!” (não é apenas na política que a palhaçada é recriminada), agora os adeptos dominam conceitos complexos como “gestão danosa”. As “obrigações” do clube já não são honrar a camisola e comer a relva, agora é uma coisa que se emite e tem taxa de juro. E “passivo” já não se refere a um lateral que é pastelão. Não percebo, nem quero perceber, nada disso. Se fosse fã de relatórios e contas acompanhava as Olimpíadas de Matemática e não a Liga dos Campeões. Instado a comentar a saída do atleta, o treinador do Porto não foi inocente na escolha de palavras, falando em “grandes empresas”. Foi nesse instante que caí em mim: eu torço por uma grande empresa. E não sou a única. Isto é tão absurdo como sofrer com o desempenho da Somague, e querer ganhar à Mota-Engil, mas agora não há volta a dar. Estamos destinados a sofrer pelas nossas sociedades anónimas desportivas de coração. Somos destas firmas desde pequeninos, desde o tempo em que não eram firmas, tudo no futebol era subjectivo e os objectivos eram títulos (desportivos, não de dívida). Para nos adaptarmos ao futebol moderno temos de ser menos sentimentais. Mais objectivos.
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