Quando o secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, chamou “estrume” ao programa Sexta às 9, da RTP, foi acusado de indignidade. A oposição considerou que um membro do Governo não devia insultar deste modo um espaço de informação. Pessoalmente, confesso que também fiquei perplexo. Com a oposição.
Bem sei que estamos habituados a que responsáveis políticos reajam com grosseria a trabalhos jornalísticos que não lhes agradam, mas desta vez creio que a oposição se precipitou e foi injusta. O Sexta às 9 tem investigado a concessão da exploração de lítio em Montalegre, processo no qual Galamba está envolvido, e por isso a oposição interpretou as palavras do secretário de Estado como um insulto. No entanto, o estrume é, como sabemos, um poderoso fertilizante. Adicionando matéria orgânica e nutrientes, melhora os solos e desenvolve a produção agrícola. Enriquece o terreno com fósforo, azoto, magnésio, potássio, cálcio, zinco, potássio e cobre. Inúmeros elementos – nenhum dos quais, curiosamente, é o lítio. Não há qualquer insinuação maldosa. João Galamba, recorrendo a uma metáfora agrícola, estava na verdade a dizer que o programa de Sandra Felgueiras aduba os factos para fazer florescer a verdade. Era claramente um incentivo, e não uma crítica. Claro que, quando acrescentou que o programa era uma “coisa asquerosa”, Galamba correu o risco de ser mal interpretado, e a oposição aproveitou. Acontece, no entanto, que o estrume é, objectivamente, uma coisa asquerosa, uma vez que é composto por, entre outras substâncias, dejectos de animais. Sucede, por isso, que o secretário de Estado estava agora a ser rigoroso e, ao mesmo tempo, lírico: assinalar que mesmo uma coisa asquerosa pode ter efeitos benignos é uma operação poética que eu, na minha qualidade de coisa asquerosa, agradeço. Tanto o estrume como eu não estamos habituados a estas serenatas, e creio que já merecíamos.