É nestas alturas que a gente pensa se não seria melhor que Portugal fosse mais parecido com um daqueles países chatos, tais como, digamos, a Bélgica. Calma. Tenho amigos que são belgas, e defendo que eles devem poder casar-se e adoptar crianças. Mas parece-me inegável que a Bélgica é um país que não entusiasma ninguém, nem os próprios belgas. É uma espécie de França mais pequena e de Suíça menos rica. Os belgas distinguem-se sobretudo por fritarem bem batatas – que é, sem dúvida nenhuma, um dos talentos mais aborrecidos do mundo. A bandeira deles é uma espécie de bandeira alemã com outra orientação. A principal atracção de Bruxelas, recordo, é um menino a fazer xixi. E, no entanto, esta absoluta vulgaridade apresenta-se agora como extraordinariamente sedutora. Comparado com a Bélgica, Portugal é um cansativo carrossel de emoções extremas. No dia 10 de Abril do ano passado, o Público escrevia: “Covid-19: imprensa internacional elogia ‘o bom exemplo’ português”. Der Spiegel, Le Monde e The New York Times estavam encantados connosco. E nós, como sempre, encantados com o encanto que os estrangeiros tinham por nós. Menos de um ano depois de sermos os melhores do mundo, somos os piores do mundo. De elogiados internacionalmente, passámos a ser execrados internacionalmente. Conseguimos tudo menos passar despercebidos.
O que se passou? Em princípio, nada. Conhecendo-nos, provavelmente tivemos alguma sorte no início e algum azar agora. Tem havido um debate interessante acerca da Suécia. O plano sueco distingue-se do da generalidade de outros países por ter adoptado uma estratégia diferente e, ao que tudo indica, distingue-se do português por ser um plano. Não parece possível que, se nós tivéssemos um plano, ele resultasse em cheio em Abril e fracassasse por completo em Janeiro. O mais provável é que não houvesse plano e a realidade se limitasse a acontecer-nos. Talvez tenhamos tomado medidas de valor idêntico à dança da chuva. Comprovadamente, a dança da chuva tem uma taxa de eficácia maior nuns meses do que noutros. Em Março resulta quase sempre, em Agosto quase nunca. O que significa que o mérito de Abril talvez não fosse nosso. Mas, infelizmente, o demérito de Janeiro talvez seja. Isto de sermos alternadamente os melhores e os piores do mundo acaba por cansar. Agora sabia mesmo bem uma vulgaríssima mediania. Quem diria que teríamos de nos esforçar para obter uma doce e tranquila mediocridade.
(Crónica publicada na VISÃO 1455 de 21 de janeiro)