No dia em que o Reino Unido excluiu Portugal da lista de países para os quais os britânicos podem viajar sem perigo nem necessidade de quarentena no regresso, o nosso país ficou no lixo sanitário. Há uns anos, como nos recordamos, Portugal estava no lixo financeiro. Agora, o facto de estarmos no lixo sanitário vai colocar-nos por consequência no lixo turístico, o que nos levará de novo, muito provavelmente, ao lixo financeiro. Há duas ou três reflexões a fazer a propósito desta sujeira toda. A primeira é que as pessoas dos países ricos não sabem separar o lixo. Ora nos põem num contentor, ora noutro. A falta de educação de nos chamarem lixo ainda se tolera; a agressão ao ambiente é imperdoável.
A segunda é que não é vergonha ser lixo. Nós, em princípio, somos um resíduo orgânico que é dos melhores lixos. Do lixo que Portugal é brota linda vegetação, que depois arde no tempo quente, uma vez que também somos lixo a prevenir incêndios. Além disso, somos lixo versátil. Conseguimos ser lixo em várias áreas. E só podemos melhorar. É difícil descer abaixo de lixo. Temos um potencial de crescimento enorme. Não podemos perder. Se as coisas correrem mal, ficamos no lixo, que é onde já estamos. Se correrem bem, saímos do lixo, o que deve ser agradável.
Em terceiro lugar, ser lixo e estar no lixo são coisas diferentes. Às vezes, coisas que não são lixo vão parar ao lixo, e o inverso também é verdadeiro: o que não falta para aí são coisas que não estão no lixo mas deviam estar. Neste caso, quem nos pôs no lixo foi o Reino Unido – que, no que diz respeito aos números da pandemia, está ainda mais no lixo do que nós. Se, por um lado, o Reino Unido pode reconhecer lixo com a autoridade que é conferida a quem está no lixo, por outro, não faz sentido que lixo grande esteja a olhar com sobranceria para lixo menor. Na verdade, para um britânico, fazer férias em Portugal consiste em sair de uma lixeira imunda para vir espairecer a uma lixeira um pouco menos suja. Estão numa pocilga a desdenhar de uma barraca bastante desarrumada. Pode ser uma diferença subtil, mas existe. Talvez o lixo em que estão metidos lhes tenha tolhido o olfacto e não reconheçam que o nosso lixo cheira ligeiramente menos mal. As melhoras.
(Opinião publicada na VISÃO 1427 de 9 de julho)