Precisamente na altura em que me encontrava a elaborar um estudo acerca de estudos sobre a Covid, a revista Science publicou um estudo acerca de estudos sobre a Covid. Desapontado, comecei então a compor o primeiro estudo sobre estudos acerca de estudos sobre a Covid, que tenho o prazer de apresentar agora. O primeiro estudo acerca de estudos sobre a Covid que estudei foi, então, o da revista Science, cuja conclusão geral é: há demasiados estudos sobre a Covid, e os cientistas não conseguem estudá-los todos. Só na semana anterior à publicação da revista, diz um cientista queixoso, saíram quatro mil estudos. Ora, essa era exactamente a conclusão do meu estudo sobre estudos. Não só os estudos são muitos como, muitas vezes, são contraditórios. Há dois grandes tipos de estudos: os que avançam com uma teoria; os que dizem que afinal não. Tudo isto é normal em ciência, uma vez que é um tipo de saber que se verifica a si próprio, mas irrita leigos. Como eu sou mesmo muito leigo, fico mesmo muito irritado.
Os estudos sobre nutrição já me tinham habituado à volatilidade da ciência. Cada nutriente tem um estudo que o louva e um estudo que o critica. No momento em que eu levo à boca um alimento elogiado por um estudo, sai outro estudo que recomenda que eu coma outra coisa. Sobre a Covid, tem acontecido mais ou menos o mesmo. Antes, a OMS desaconselhava o uso de máscara; depois passou a recomendar. Primeiro, um estudo sugeria que o vírus podia permanecer durante 72 horas em superfícies como plástico ou aço; agora, a OMS diz que não há provas de contágio através de superfícies e objectos. O problema é o seguinte: eu estava habituado a que a ciência me pusesse a fazer figura de parvo na escola, por intermédio de perguntas a que eu não sabia responder, nos testes de Física, Química e Biologia. O que eu levo a mal é que a ciência continue a conseguir pôr-me a fazer figura de parvo 30 anos após o fim do liceu. Desinfectar as compras do supermercado, que era ligeiramente aviltante há duas semanas, passou a ser retroactivamente ridículo agora. Todos os que estiveram meia hora a imunizar um cacho de uvas, bago a bago, compreendem bem a humilhação que o método científico nos infligiu. Foi para evitar isto que eu fui para Letras – e mesmo assim não resultou.
(Opinião publicada na VISÃO 1420 de 21 de maio)