Estou em Leipzig por dois dias. É a quarta vez que venho à cidade. A jovem empregada do Stein Café, que vende croissants veganos na praça do Mercado, reconhece-me, Outra vez por aqui? Lembra-se de eu lhe ter dito que de quando em quando fico com saudades destes croissants, É verdade, insisto. Ela ri-se. Acha graça haver alguém longe, em Portugal, ligada ali por tão pouco, Ainda se fosse… Reconsidera o que ia dizer ao recordar a kartoffelsalat que a avó costumava fazer. Não resiste à curiosidade de perguntar o que me tem trazido à cidade. Explico que Portugal era o país convidado da feira do livro de Leipzig, no ano de 2020, mas que por causa da pandemia a feira foi sendo substituída por vários encontros de menor dimensão, Ah, é escritora, exclama com surpresa. Confessa que não gosta de ler, Escreve sobre o quê? Hesito. Perguntam-me isto desde sempre, Escrevo sobre o quê? Receio que quando souber a resposta certa nada mais tenha para escrever. Evito encontrá-la, respondo trivialidades. Desta vez digo, Escrevo sobre os sabores de que não me consigo esquecer, ou de que não me quero esquecer. Ela ri-se, um riso generoso. Gosto das pessoas que riem assim e distraio-me do incómodo que as botas me causam. Por causa do frio que passei em Estrasburgo, trouxe umas botas forradas a pelo, demasiado quentes. O que pensa Portugal da guerra?, pergunta-me a amável empregada, repentinamente séria.
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