Esta semana, Portugal acolheu 273 refugiados do Instituto de Música do Afeganistão na sua nova casa: Lisboa. Ahmad Sarmast, diretor e fundador do instituto, conseguiu fugir com os músicos para o Qatar assim que os talibãs tomaram o poder. De lá, voaram para Portugal. O edifício da escola em Cabul foi entretanto saqueado, ocupado e convertido num centro de comandos militar. Por cá, é difícil não nos comovermos com a imagem da jovem maestrina Marzia Anwari a abraçar o professor no aeroporto. À entrada em Portugal, diz estar “muito feliz” por ver finalmente os seus “amigos a sorrir”. Aos olhos da imprensa internacional, o grupo vem “encontrar esperança” em Lisboa. A esperança que oferece o verde à nossa bandeira.
Despediram-se do Qatar com um concerto. Antes de rumar a Portugal, a orquestra feminina do instituto afegão, Zohra, atuou em Doha, capital catariana. “Se eles [os talibãs] soubessem que éramos músicas ter-nos-iam matado”, disse maestrina de 18 anos Shogofa Safi à France-Presse. Segundo a lei sharia, só as mulheres “promíscuas” se dedicam à música. Sendo “muito assustador sair do país”, nem todas as jovens o conseguiram. A Orquestra Nacional do Afeganistão é, desde a fundação em 2010, uma referência nacional na luta pela igualdade de género – para além de um projeto de destacada qualidade musical e de ensino. Conjugando a riquíssima herança musical do Afeganistão com a tradição ocidental, as formações musicais do Instituto já lotaram auditórios conceituados na Europa e nos EUA – antes da invasão talibã. O obscurantismo assassino dos talibãs abomina a música. Além de um gesto solidário, de um exemplo humanitário, de um feixe de luz no breu dos tempos, receber esta instituição em Portugal é um prestígio para o país.
E um orgulho. O grupo de refugiados afegãos chegou na segunda-feira ao aeroporto militar de Lisboa, integrando estudantes, professores e seus familiares diretos. De acordo com o ministro Santos Silva, a chegada a salvo destas pessoas é o culminar de um longo processo. Portugal recebeu 764 refugiados afegãos desde o verão – vários dos quais ativistas pelos direitos humanos, jornalistas, funcionários da antiga administração afegã ou mulheres que, pelo seu destaque ou opção profissional, seriam perseguidas pelos talibãs. “Foi uma viagem muito longa para a liberdade”, diz-nos Ahmad Sarmast. Para o professor, os músicos do Instituto serão doravante um “símbolo de coragem e superação” para o povo afegão. Para os portugueses, recebê-los é um exemplo daquilo que mais nos deve orgulhar. Na semana passada, escrevi sobre como Portugal tem o dever de oferecer futuro a quem cá vive. Vou mais longe. Portugal deve ao mundo honrar a esperança. Afinal de contas, está plasmada no verde da nossa bandeira.
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