Neste período em que se comemoram o 25 de abril e o dia do trabalhador urge relembrar a relevância para as nossas vidas da conquista de direitos e liberdades individuais e coletivas.
A Constituição que emergiu do período pós-revolucionário afirma logo no seu artigo primeiro que “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária”.
Nela encontramos uma divisão sistemática entre direitos, liberdades e garantias (título II) e direitos económicos sociais e culturais (título III). Utilizando as palavras do constitucionalista Jorge Miranda, “Os direitos, liberdades e garantias são direitos de libertação do poder e, simultaneamente, direitos à proteção do poder contra outros poderes. Os direitos sociais são direitos de libertação da necessidade e, ao mesmo tempo, direitos de promoção. O conteúdo irredutível daqueles é a limitação jurídica do poder, o destes é a organização da solidariedade. Liberdade e libertação não se separam, pois; entrecruzam-se e completam-se; a unidade da pessoa não pode ser truncada por causa de direitos destinados a servi-la e também a unidade do sistema jurídico impõe a harmonização constante dos direitos da mesma pessoa e de todas as pessoas.”
Com abril conquistaram-se liberdades individuais fundamentais como a liberdade de expressão e de informação; a liberdade de imprensa; a liberdade de consciência, de religião e de culto; a liberdade de criação intelectual, artística e científica; a liberdade de aprender e ensinar; mas também se traçou o caminho para todo um conjunto de liberdades essenciais a garantir uma efetiva igualdade, como a libertação e liberdade das mulheres ou a liberdade de opção sexual e de género.
Da mesma forma passaram a ter consagração constitucional as liberdades de reunião, manifestação e de associação.
Ao nível do sistema judiciário apenas com a Constituição de 1976 se consagraram expressamente a independência dos Tribunais e a autonomia do Ministério Público, enquanto garantes para os cidadãos de uma justiça livre de interferências e condicionamentos dos outros poderes e que garanta os seus direitos e liberdades fundamentais nela consagrados.
As liberdades conquistadas não devem, contudo, ser dadas por adquiridas.
Assistimos hoje, tantas vezes, a movimentos e tentativas de limitação das liberdades conquistadas, de condicionamento e instrumentalização, não só dos órgãos de comunicação social, mas também do próprio sistema de justiça, a que devemos estar atentos.
A liberdade de decisão de juízes e magistrados do Ministério Público pode ficar comprometida com reformas e alterações legislativas que visam a cada vez maior funcionalização dos magistrados e a sua submissão a estruturas de normalização e administrativização do sistema de justiça ou instrumentos de gestão interna das próprias magistraturas com o mesmo objetivo.
Tais reformas apresentadas sob o desígnio de conferir maior eficácia ao sistema de justiça podem disfarçar e camuflar uma vontade do poder político de limitar a independência dos Tribunais e de esbater a separação de poderes.
Apenas estão garantidas as liberdades individuais e coletivas conquistadas em abril se tivermos Tribunais independentes e magistrados judiciais e do Ministério Público livres.
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