Vivenciamos a nível mundial um contexto de desaceleração económica, com a inflação a atingir valores máximos não observados desde há várias décadas, um contexto de guerra e o aumento do custo de vida.
As perspetivas otimistas do Governo Português foram refreadas por Bruxelas que prevê um crescimento económico mais modesto e uma inflação a manter-se em níveis elevados no próximo ano.
A previsão para este ano é que a inflação em Portugal se situe nos oito por cento.
Neste cenário de aumento generalizado do custo de vida, designadamente da energia, dos combustíveis, dos bens alimentares, esperava-se dos partidos políticos que dedicassem toda a sua atenção e empenho no Orçamento do Estado para 2023, procurando chegar a um documento final que permitisse aos trabalhadores da administração pública, pelo menos, a manutenção do seu atual poder de compra. Isto porque qualquer aumento dos trabalhadores em valor inferior ao da inflação, como parece ser a proposta do Governo até agora conhecida, equivale a um corte, por via indireta, nos seus vencimentos.
Mais, não foi ainda fornecida pelo Governo qualquer explicação válida para o facto de todos os funcionários e corpos especiais da administração pública não terem no próximo ano um aumento salarial alinhado com o nível da inflação, até porque a previsão é de que as receitas fiscais continuem a aumentar.
Eis senão quando, em plena discussão na Assembleia da República, do Orçamento do Estado para 2023, quando todos os portugueses esperavam que os esforços dos partidos políticos se concentrassem em pugnar pelas melhores soluções orçamentais que permitissem aliviar a pressão decorrente do aumento do custo de vida, vimos que os partidos políticos decidiram mudar o seu foco de atenção para avançarem com propostas de revisão constitucional.
Confesso a minha perplexidade perante tal arrojo político.
Num momento em que se exige do Estado um OE capaz de dar confiança às empresas e às famílias, num quadro de dificuldades e sufoco financeiro, avançar com propostas de revisão constitucional, uma matéria igualmente séria, responsável e exigente, é divergir daquilo que neste momento deveria ser a especial preocupação de todos os partidos políticos: a aprovação de um Orçamento do Estado para 2023 que não traga encapotado um corte de vencimentos dos trabalhadores da administração pública e que lhes devolva o poder de compra que o aumento do custo de vida lhes tirou ou, pelo menos, diminuiu.
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