Na estratégia do Governo para o combate à corrupção nos próximos quatro anos o enfoque vai para a prevenção enquanto vetor essencial ao enfrentamento deste fenómeno.
Não podemos deixar de considerar acertada tal perspetiva, na medida em que é atuando a montante e prevenindo a existência de contextos geradores de práticas corrutivas que a longo prazo serão possíveis profundas mudanças estruturais e culturais nos organismos públicos e na sociedade em geral.
Um dos principais desafios quanto à eficácia das medidas de prevenção reside em assegurarem que estas se baseiem num diagnóstico preciso dos riscos e dos fatores de vulnerabilidade.
As medidas de prevenção têm de centrar-se nos problemas que visam corrigir e ser aplicadas sempre que tal seja efetivamente necessário. Caso contrário, podem tornar-se um mero exercício burocrático.
Sem uma aplicação e um seguimento adequados, mesmo uma estratégia de prevenção mais complexa será apenas uma mera formalidade com um impacto reduzido sobre a incidência da corrupção.
De qualquer forma quaisquer medidas que venham a ser implementadas apenas darão o seu fruto a longo prazo e isto a admitir-se que vão ser eficazes.
Entretanto, não podemos esquecer que a repressão também tem a sua vertente preventiva, na medida em que os sentimentos de permissividade e impunidade associados ao fenómeno podem ser um obstáculo à própria mudança estrutural e cultural que se impõe.
A capacidade do sistema judicial para impor sanções penais dissuasoras é fundamental para efeitos de prevenção, constituindo um sinal claro de que a corrupção não é tolerada.
A eficácia da repressão requer um claro reforço dos meios ao dispor dos Tribunais, do Ministério Público e dos órgãos de investigação criminal.
É fundamental que os organismos responsáveis pela aplicação da lei sejam independentes e disponham dos fundos, recursos humanos, capacidade técnica e profissionalismo necessários.
A eliminação dos entraves à capacidade do sistema judicial para reprimir e punir a corrupção de forma eficaz impõe um investimento claro do Estado no reforço dos meios humanos e orçamentais ao dispor da investigação criminal.
Temos assistido nos últimos anos a um claro empobrecimento dos quadros de magistrados, funcionários e da polícia judiciária.
Não podemos esquecer que a criminalidade relacionada com o fenómeno da corrupção, a criminalidade económico-financeira, assume não raras vezes uma complexidade muito superior ao crime comum, com a necessidade de perícias que exigem especiais conhecimentos técnicos e com um elevado acervo documental a analisar e tratar, pouco compatíveis com o trabalho isolado de um só magistrado do Ministério Público ou de apenas um inspetor da polícia judiciária que para além desse ainda tem a cargo outros processos.
Importa por isso reforçar o quadro de magistrados e de inspetores da polícia judiciária para que no domínio da criminalidade económico-financeira possa existir disponibilidade exclusiva para um só processo ou mesmo a afetação de mais de um magistrado ou inspetor da PJ a um só processo.
O valor fixado por tabela para atribuição de honorários a peritos torna muitas vezes difícil, quando são necessários especiais conhecimentos técnicos, encontrar disponibilidade de profissionais credenciados para a realização das perícias.
Importava, pois, a bem da própria independência e eficácia da investigação, um reforço claro dos meios financeiros ao dispor do Ministério Público e, designadamente, sempre que o justificasse, a possibilidade de contratação de peritos a preços mais próximos do mercado.
Outras medidas prendem-se com a eliminação de disposições demasiado rígidas, excessivas ou pouco claras, em matéria processual, designadamente no que concerne aos meios de prova, numa cultura de permanente desconfiança com os juízes e os magistrados do MP, que camuflada pela ideia de um garantismo aparente, apenas visam minar e dificultar o funcionamento da justiça.
Os fenómenos corruptivos, nas suas diferentes configurações, atentam contra princípios fundamentais do Estado de direito, enfraquecem a credibilidade e a confiança dos cidadãos nas instituições e comprometem o desenvolvimento social e económico, fomentando a desigualdade, reduzindo os níveis de investimento, dificultando o correto funcionamento da economia e fragilizando as finanças públicas.