Mal entreguei as provas de exame 639, corrigidas a muito custo, percebi que era chegada a hora de parar. Ou, pelo menos, de tentar. Mas este objetivo saiu gorado pois continuaram a surgir tarefas e mais tarefas, ao ponto de, no momento preciso em que escrevo este texto, o último deste ano letivo (2019-2020), ter percebido que pela minha parte chega. Fechei a loja. Cumpri tudo o que me foi pedido e ultrapassei o número de horas dedicadas à escola desde que as aulas presenciais terminaram. Se fazem favor, esqueçam por uns dias que eu existo: fui professora dos três anos do ensino secundário, diretora de turma de um 12ºano com alguns pais e encarregados de educação com Covid-19 (o que impediu os seus educandos de fazer os exames na 1ª fase), classifiquei os exames nacionais… E, por favor, Senhor Diretor, Senhora Adjunta do Diretor, Senhor Coordenadora dos Diretores de Turma, Senhora Chefe da Secretaria; Senhora Coordenadora de Departamento, Senhora Coordenadora de Grupo disciplinar, Senhoras e Senhores Pais e Encarregados de Educação, alunos, repito, por favor não me enviem mais emails.
Desta pouca capacidade que me resta para pensar, ocorrem-me apenas algumas ideias gerais antes de ir a banhos:
- A escola é cada vez menos democrática; perguntam-nos, talvez por descarga de consciência, para opinarmos nos grupos de departamento sobre temas fraturantes mas raramente o que defendemos é ouvido e muito menos seguido.
- Houve um pai que proibiu os filhos de frequentar as aulas de Cidadania alegando objeção de consciência em relação ao programa da disciplina; e se um pai vier decidir que não quer que o filho estude Saramago por discordar com as suas ideias demasiado revolucionárias sobre a existência de Deus, impede-o aluno de frequentar as aulas de Português do 12º ano?
- Parece que há uma professora do 1º ciclo que gosta de livros mas não gosta de os ler; ai, se vocês soubessem sobre a quantidade de professores que não podem ler ou que não sabem ler…
- Sei de casos de professores que praticamente não deram aulas online durante o periodo de confinamento enquanto outros correram a comprar computadores e microfones e colunas e mesas digitais.
- O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa considerou que o salário mínimo de 635 euros era razoável no contexto português, pelo que considerará certamente o ordenados dos professores mais do que suficiente para viver decentemente.
- Os alunos regressarão às escolas em setembro com máscara e uma distância de 1 metro entre eles, decisão que me parece impossível se mantiverem o tamanho habitual das turmas.
- Estão a ser equacionados três cenários para o regresso às aulas; se me perguntassem qual dos três cenários para o novo ano letivo eu escolheria, a saber: (i) aulas totalmente presenciais; (ii) regime misto com percentagem maioritária de aulas presenciais e uma pequena parcela de aulas síncronas; (iii) aulas totalmente online, optaria sem dificuldade pelo segundo.
Passo a explicar. Um regime misto de aulas para o próximo ano letivo teria a vantagem de evitar que passássemos (professores, alunos e auxiliares) tantas horas na escola, permitindo uma melhor gestão na transmissão/propagação do vírus; por outro lado, um sistema misto bem organizado e preparado traria a mais valia de integrar de forma eficiente as novas tecnologias de informação e de comunicação no processo de ensino e de aprendizagem (com regras e critérios bem definidos), algo que considero ter sido apenas levemente trabalhado durante o período de confinamento. Mas para já, precisamos todos de férias. Se fazem favor, não me falem já do regresso às aulas que eu preciso de tempo para ler uns bons livros…