Gostaria de participar no debate em curso sobre o Serviço Nacional de Saúde com duas ou três ideias que tenho. Em primeiro lugar, eu acho que o Serviço Nacional de Saúde devia ser um serviço. Em segundo lugar, creio que devia ser nacional. Por último, estou firmemente convencido de que devia ser de saúde. Sei que são ideias que cortam de um modo bastante radical com a maneira como o SNS está organizado agora, mas às vezes é preciso pensar, como se diz agora, fora da caixa.
Vamos por partes. Primeiro, devia ser um serviço. Ora, de acordo com uma pesquisa que levei a cabo, para que haja um serviço tem de haver quem o preste. A insuficiência de profissionais de saúde conduz, o que é curioso, a insuficiência nos serviços de saúde. E, na impossibilidade de recrutarmos profissionais de saúde em regime de voluntariado, torna-se necessário pagar-lhes – o que é uma pena. Vários profissionais de saúde com quem tenho falado revelam que a atribuição de um salário lhes dá jeito para, por exemplo, terem uma casa onde dormir. Como sabemos, trata-se de uma desculpa esfarrapada porque, com turnos de 24 horas, é muito improvável que consigam ir a casa. Mas uma vez que eles, por teimosia, insistem em receber, é preciso que o Orçamento do Estado preveja essa despesa.
Segundo, devia ser nacional. Quer isto dizer que seria conveniente haver estabelecimentos de saúde em todo o País. A outra hipótese é obrigar os habitantes de certas zonas a prometer que não adoecem, talvez através de incentivos fiscais. Seja qual for a solução, também terá custos para o Orçamento do Estado.
Terceiro, devia ser de saúde. Esta ideia parte da constatação de que a permanência em estabelecimentos de saúde nem sempre constitui um cuidado de saúde. Por exemplo, estar à espera de ser observado por um médico faz ligeiramente menos efeito do que ser mesmo observado por um médico. A circunstância de haver listas de espera para ser atendido no SNS poderá fazer sentido, mas apenas se houver listas de espera para pagar impostos. Não havendo, o sistema torna-se mais difícil de compreender. Em todo o caso, reduzir os tempos de espera implica onerar o Orçamento do Estado.
No entanto, o Orçamento do Estado é controlado por Mário Centeno, que tem evitado investir no SNS porque desconfia, e com razão, de que os doentes querem gastar tudo em drogas. São drogas legais, mas são drogas.
(Crónica publicada na VISÃO 1396 de 5 de dezembro)